sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Falando Bem ou Mal - Meu condomínio é um canteiro de obras

Aqui a pandemia nunca começou. Aconteceu que, na calda das verdades e das inverdades de uma minúscula espécie assassina, meus vizinhos de classe média pararam, seguindo modelo de outros povos de perto ou distantes, e se obrigaram a ficar em casa para evitar o desconforto de sair com máscaras. Regras visíveis aos de longe respeitadas. Determinações próximas desconsideradas. "Não pode fazer obra no condomínio? Quem inventou isso?" E chegaram caminhões com cimento, areia, pisos, latas de tinta. Muitos. Com eles os carregadores, alguns jovens, outros na fase do "típico fulano com comorbidade". O piso transportado por eles nem sempre respeitou os decretos de isolamento. E as máscaras, com a força e a respiração ofegante, caiam nos queixos. Crianças subiam e desciam brincando nos elevadores. As escadas viraram esconderijos para brincadeiras de corre-corre. E o barulho irritante das marretas quebrando concreto? Serra elétrica, parafusador recarregável, furadeiras e outros apetrechos barulhentos subiam e desciam, como se a ordem fosse "fazer barulho" para espantar os bichinhos. No outro lado da rua, não uma, mas tantas vezes, o aparador da minúscula área gramada do condomínio trouxe sua equipe para competir. Dois homens com cortadores, um elétrico e outro de combustível, além de um terceiro com o assoprador atormentante, gastaram um dia inteiro para fazer o que um jardineiro com ferramentas tradicionais faria em metade do tempo, sozinho. E foram embora ainda com a luz do sol, máscaras cobrindo os queixos, deixando no meio da rua e nas calçadas dos vizinhos o resto que o assoprador não escondeu embaixo dos carros. Festa não teve, isso pode ser garantido. Mas uns e outros ajuntaram visitas nas sacadas e consumiram cervejas. Deu para perceber quando as mulheres começaram a falar mais do que a potência de suas vozes, gritando para serem ouvidas, e os homens, hiláricos e hilariantes, riam de qualquer coisa sem graça. Se um inseto passava e raspava na cabeça de um, aquilo era motivo de gargalhada. Coisa de louco. Será?

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