quarta-feira, 16 de setembro de 2015

REPORTAGEM – Três dias no lombo de um burrinho e a vida dos Nakama acontece em Londrina

Padeiro, carroceiro, cerealista, feirante, comerciante de
bar e empresário do ramo de combustível, entre outras atividades, fizeram de Maria e Saitoko, que chegaram em meados dos anos de 1940, grandes batalhadores; depois, lá nos anos de 1960, Maria fundou um salão de beleza, que a filha Helena mantém até hoje e a neta Andressa encara de cabeça após deixar a área de Direito, na qual se formou e se especializou.


Andressa e Helena ladeiam Maria: três gerações 
no instituto de beleza

Aos fundos, a casa construída por Saitoku Nakana
na Rua Guaporé; a construção da frente está sendo preparada
para aumentar o instituto de beleza

No quintal vizinho, a casa que serviu de alojamento
para os trabalhadores da empresa dos Nakama


 A ORIGEM

            Os 136 quilômetros em linha reta entre Londrina e a cidade paulista de Álvares Machado pareciam muito mais naquela época em que dona Maria Tomoyoshi Nakama, com a filha Helena, de oito meses, nos braços, e grávida do segundo filho, Fernando, viajou de lá para cá num caminhão. O marido dela, Saitoku Nakama, decidira fazer o percurso no lombo de um burrinho, pois havia planejado trabalhar no Norte do Paraná com a venda de frutas e verduras.
            A carrocinha que seria puxada pelo burrinho veio de trem. Mas o animal não podia ser transportado. Saitoku demorou três dias para chegar. É conveniente explicar que, atualmente, de carro, rodando em rodovias convencionais, a distância entre Londrina e Álvares Machado é de 172 quilômetros. Pisando leve o percurso pode ser feito tranquilamente em, no máximo, três horas. Mas a viagem de Maria e Helena no caminhão e de Saitoku no lombo do burrinho foi em 1944. Estradas eram, quando havia um traçado feito, muito precárias.
            Dona Maria lembra que o burrinho que pertencia ao marido era teimoso, pois não havia sido adestrado. A possibilidade de o animal empacar nas ruas de Londrina quando Saitoku saísse para vender as frutas e as verduras levantou preocupação. Foi então que o irmão de Maria se dispôs a trocar o burrinho adestrado que possuía pelo burrinho teimoso que era do cunhado.
            Saitoku, já falecido, nasceu no Japão e chegou ao Brasil quando estava com 17 anos de idade. A família se estabeleceu na região de Araraquara, no Estado de São Paulo. Um dia Saitoku escreveu uma carta a parentes que moravam na região de Álvares Machado. Ele queria aprender a trabalhar na construção civil, mas resposta à carta enviada aos parentes foi categórica: que ele mudasse para aquela cidade e aprendesse o oficio de padeiro, no qual parentes já trabalhavam.
            Maria nasceu na localidade de Prainha, na região de Santos, Estado de São Paulo, no dia 17 de dezembro de 1924. Com 90 anos de idade, esbanja vigor e mostra-se bastante disposta. Maria e Saitoku tiveram, além de Helena e Fernando (já falecido), o terceiro filho, Luiz Carlos.
            Em Londrina, a primeira moradia foi numa chácara. Mas pouco tempo depois a família adquiriu terreno na região da Vila Nova. A casa construída no local por Saitoku, já em alvenaria, ainda se mostra impecável na Rua Guaporé, próximo a Rua Araguaia.
            Maria sempre participou ativamente das atividades econômicas do marido. Ela lembra que quando Saitoku vendia frutas e verduras na carrocinha puxada pelo burrinho que o trouxe de Álvares Machado até Londrina, os fregueses saiam às ruas para esperar a chegada do verdureiro.
            Tempos depois Saitoku e Maria tornaram-se grandes empresários do ramo de cereais e de transporte. A sede principal da empresa ficava na Rua Guaporé, perto da primeira casa construída por Saitoku. Devido à movimentação, além da sede principal um outro local nas proximidades foi alugado para a empresa. Uma casa de madeira nos fundos de onde a família morava servia de alojamento para trabalhadores da cerealista. Dona Maria era a responsável pela alimentação dos empregados e pelas boas condições do alojamento.
            Saitoku ia buscar arroz no Rio Grande. A cebola, que na época era vendida em réstia, também vinha de lá. De Araraquara a empresa trazia açúcar para fornecer na região. Do Mato Grosso vinha quirela de arroz que era fornecida para uma cervejaria de Londrina. “Os caminhões grandes eram para trazer produtos de fora. Os pequenos eram para fazer a praça”, relata Maria.
            Saitoku também teve banca de feira livre no centro de Londrina. Foi também dono de um bar na Rua Quintino Bocaiúva e empresário do segmento de transporte. Por 12 anos, antes de se aposentar, foi para São Paulo onde comprou um posto de combustível perto da Ceasa. Com a aposentadoria Saitoku e Maria retornaram a Londrina. Ela mora hoje no Bairro Aeroporto. A casa que Saitoku construiu na Rua Guaporé é habitada pela filha Helena e pela neta Andressa, casada com Luiz Roberto e pais de Luiz Henrique e Luiz Guilherme.

DE MÃE PARA FILHA...  

Maria e o diploma obtido em 1963

O diplona da filha Helena, de 1966

            As mulheres da família sustentam um negócio que já está na terceira geração desde que Saitoku e Maria vieram de Álvares Machado para Londrina. Trata-se de um salão de beleza fundado por Maria na região central da cidade. Ficava na Rua Mato Grosso, no quarteirão em frente a uma das entradas do Shopping Royal.
            Maria tem diploma, datado de 20 de setembro de 1963, de cabeleireira. No salão dela também funcionava uma escola de cabeleireiros. Por isso o estabelecimento era enorme: havia 11 espelhos (bancadas).
            A filha Helena estudava piano e fazia o curso normal. Apesar de morar em Londrina ela ia até Cambé, onde tinha aulas com o maestro Andréa Nuzzi, autor do hino da cidade vizinha, e cursava normal na escola Gabriela Mistral.
            “Ela queria ser professora”, afirma Maria, sobre a filha. A passagem de Helena pelo salão da mãe ocorria nos fins de semana, para uma ajuda ou outra. Nem quando Maria adoeceu e precisou ir a São Paulo para tratamento Helena aceitou ficar com o salão que a mãe havia montado. Maria vendeu o estabelecimento: “Vendi barato e a prestação”.
            Não demorou muito e Helena deixou o sonho de ser professora para abrir um novo salão, na frente da casa construída lá pelos anos de 1940 pelo pai, Saitoku. Só na residência, que pelas contas de Maria deve ter 69 anos, a filha Helena está morando há 62 anos. O salão Helena Yamada – Instituto de Beleza, está para completar em breve 50 anos.
            “Antes não havia o costume das mulheres marcarem horário para ir ao salão. Como elas eram mais assíduas nesses locais, para arrumar os cabelos até para as missas e os cultos dos finais de semana, as mulheres iam direto nos salões e chegavam a formar fila”, lembra Helena. “Aqui a fila chegava na Rua Guaporé”, acrescenta.
            Helena, que chegou a Londrina quando estava com oito meses de idade, nasceu na localidade de Nova Pátria, perto de Álvares Machado, no Estado de São Paulo. Helena casou com Emílio Yamada, que faleceu há 11 anos. O casal teve os filhos Aristóteles (falecido), Andressa e Alexandre. São dois netos.
             
...E CHEGA A VEZ DA NETA

Andressa acumula certificados e
preocupa-se com a profissionalização do negócio
  
            Andressa Yamada Maccagnan, a filha de Helena, nasceu no dia 4 de outubro de 1976, em Londrina. Casada com Luiz Roberto Maccagnan, é mãe de Luiz Henrique Yamada Maccagnan e Luiz Guilherme Yamada Maccagnan.
            Andressa é formada em Direito e tem pós-graduação em Direito Empresarial. Também freqüentou a pós-graduação de Direito Previdenciário, mas não chegou a finalizar o processo para obtenção de certificado.
            Mas Andressa é cabeleireira. Ela trabalhou na área de sua formação. Por dez anos foi funcionário do cartório eleitoral em Londrina. Por um ano atuou no Centro de Atendimento à Mulher (CAM), também na área de Direito. Outros dois anos de trabalho foram na área de assessoria em um escritório de advocacia.
            A exemplo do que ocorreu com a mãe, Helena, Andressa também ajudava no salão nos fins de semana. Mas foi o nascimento do primeiro filho que fez Andressa largar a área de Direito e entrar com tudo na de beleza. Luiz Henrique nasceu em 2005 e um ano depois Andressa havia inclusive voltado a morar com a mãe, na Rua Guaporé, junto com o marido e os filhos.
            “Foi forte a questão da flexibilidade de horário na minha decisão. Eu queria ter uma atividade mas dispondo de condições para a minha família”, diz Andressa. Pesaram, também, as sugestões de algumas amigas: “A Isaura Kakuno foi uma das principais incentivadoras. Ela há tempos me dizia que eu devia me dedicar ao Instituto de Beleza junto com a minha mãe. Também me incentivava muito a Adriana Ferreira, que é professora na Universidade Estadual de Londrina”.
            Isaura é filha de Tsuguio Kakuno, alfaiate que foi personagem de reportagem neste blog. “A mãe da Isaura freqüentava o salão da minha mãe. E eu sempre tive uma admiração pela Isaura, pelo modo de ela ser, se vestir e se cuidar sempre com muita elegância”, diz Andressa, que enfatiza, ainda: “Além desses motivos todos a oportunidade de trabalhar com minha mãe foi muito influenciadora, principalmente por tudo o que ela fez por mim”.
            Andressa freqüentou dezenas de cursos para estar em dia com as técnicas e as novidades da área de beleza. Além de se dedicar ao Salão ela é executiva da Jeunesse e mantém uma loja virtual de produtos de beleza. É também voluntária e nesta condição ministra cursos de profissionalização na área de beleza.
            Andressa diz também que dona Olga, mãe do profissional Lincoln Tramontina, a incentiva muito, principalmente para que ela focasse o salão de beleza com visão empresarial e, enfim, como um empreendimento. 
            A participação de Andressa no negócio da família contribui, assim, também para a tomada de decisões empresarias. “Com a minha mãe o salão era bem doméstico. Hoje eu e ela trabalhamos com recursos de administração do empreendimento, como na questão do estoque. Mas de forma alguma minha mãe abandona a relação com a clientela, de algo próximo na beleza das pessoas. Tem freguesas que mudaram de bairro e continuam vindo aqui”.

Um comentário:

  1. Conheci o estabelecimento de venda de batatas na rua Guaporé (ou Pernambuco) nos idos da década de 1950 quando eu morava na rua Amapa...

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