Alcides Cândido operou por quase
três décadas os
projetores de cinemas de cidades
da região de Londrina
Nas fotos, Alcides em frente ao painel do antigo
Cine Vila
Rica, em Londrina; o projetor chegou a conhecer Mazzaropi, que vinha trazer
pessoalmente
os rolos de seus filmes
Alcides Cândido de Souza, casado
com Eurides Saraiva e pai de três filhos, todos nascidos em Cambé, é hoje, aos
68 anos de idade, um respeitado zelador de edifício no centro de Londrina. Mas,
por 27 anos, ele trabalhou naquele lugar dos cinemas onde muitos garotos
gostariam de ficar durante as exibições: a salinha lá em cima, onde ficavam os
projetores das fitas em exibição.
Ele trabalhou em Cambé, Rolândia,
Londrina e cinemas de outras cidades da região, como funcionário da Empresa
Araújo Passos. Os último cinemas por onde Alcides passou foram os cines Vila
Rica e Londrina, onde foi gerente.
Em Cambé Alcides trabalhou de
1967 a 1977. Ele lembra que a salinha de projeção esquentava, pois os
projetores funcionavam com dois elétrodos de 70 a 90 amperes. “Só tinha a
janelinha da projeção e a do operador acompanhar a tela. Raramente dava para
sair da salinha”.
Mas se havia garotos que queriam
estar no lugar dele, Alcides desenrola o novelo e conta que após as exibições
os operadores tinham que rebobinar os filmes, manualmente. O filme “Os Dez
Mandamentos” tinha 24 rolos, cada um com cerca de 20 minutos de duração, conforme
calcula Alcides.
Além do Vila Rica e do Londrina,
Alcides trabalhou também em Londrina no Cine Augusto, Cine Jóia e Cine
Espacial, que funcionava na Vila Nova. Em Cambé, conforme relata, ele chegou
muito pobre. Morava nas proximidades da Rua Caçadores e teve que improvisar uma
cama sobre latões de tinta. O colchão era de palha e tinha que ser batido
diariamente para acomodar o recheio de acordo com a preferência do corpo que
nele deitava.
O Bar do Pinga era o local de
estadia nas horas de folga. O namoro do operador de projeção foi lá pelas bandas
da Fonte Luminosa da Praça Getúlio Vargas até o Caramanchão da Igreja Matriz
Santo Antônio, durante as quermesses em Cambé. Quando estava trabalhando
Alcides olhava, de uma janela do prédio do cinema, a pretendida passando pelas
redondezas.
“Ela – a dona Eurides - morava
perto de casa e quando eu ia trabalhar no cinema a via varrendo o quintal ou a
frente de casa, perto da cerca de balaústres. Eu passava e olhava para ela, que
correspondia. Chegando lá em cima, pelas proximidades da Rua Caçadores, eu olhava
para trás e acenava. Ela correspondia”.
Dessa troca de gentilezas
aconteceram, depois, as trocas de presentes e o namoro, que durou cerca de oito
meses. Um dia Alcides e dona Eurides fugiram para casar.
Segundo Alcides, no período em
que ficou em Cambé um dos filmes com recorde de público no Cine Universo foi
“Uma Longa Fila de Cruz”, que conta a história de caçadores de recompensa atrás
de um bando especializado em assassinar mexicanos que cruzam a fronteira
americana.
É uma produção italiana de 1970,
dirigido por Sergio Garrone, e trás no elenco Anthony Steffen, Willian Berger,
Ricardo Garrone, Nicholetta Machiaveli, Mario Brega e Fred Robsham. O filme
“Fugindo do Inferno”, com Steve McQueen, trata do nazismo e de seus campos de
concentração e também deu boa bilheteria em Cambé.
O outro lado da história é que o
operador de projeção assiste filmes de graça. Mas até a exaustão. Alcides
assistiu o filme “O Exorcista” umas 200 vezes. “Na maioria das vezes a gente
conhecia o filme até de trás para frente”.
Em Londrina, Alcides conheceu
Mazzaropi. Chegou a beber café na Padaria Olímpia com o astro brasileiro. É que
nos últimos filmes do astro, depois que Mazzaropi montou seu próprio estúdio
cinematográfico e produtora, ele próprio, mesmo sendo astro, levava os seus
filmes para as salas de exibição. “Trazia três rolos do filme na mão direita e
dois na mão esquerda”, diz Alcides.
Era uma forma de Mazzaropi
garantir que seus filmes não fossem manipulados pelas empresas
cinematográficas. Naqueles tempos, segundo Alcides, algumas salas de projeção
compravam filmes nacionais somente para cumprir as determinações do Conselho
Nacional do Cinema. Estes filmes, porém, não chegavam a ser exibidos.
A última sessão de cinema
Nas fotos, cenas de
“Os Caçadores da Serpente Dourada”
Cambé está sem cinema desde
1983. A última sessão na cidade foi no feriado de 15 de novembro daquele ano. A
atração era quase um lançamento: “I Cacciatori Del Cobra D’oro”, no título
italiano original, ou “Os Caçadores da Serpente Dourada”, no português.
O filme havia sido lançado em 11
de agosto de 1982. Produzido por Gianfranco Couvoumdjian e dirigido por Antonio
Margheriti, o roteiro do próprio Gianfranco junto com Tito Carpi é tido por
alguns críticos como uma cópia invejosa de “Os Caçadores da Arca Perdida”, de
Steven Spielberg, lançado pouco antes.
A estória se passa na Segunda Guerra
Mundial, nas Filipinas. Os heróis são os britânicos e os norte-americanos:
David Warbeck faz o papel de Bob Jackson e John Steiner é o Capitão David
Franks. Ambos são convocados por suas respectivas embaixadas, nas Filipinas,
para invadirem uma base japonesa. Lá teriam que eliminar o agente duplo traidor
japonês Yamato. O elenco tem também Antonella Interlenghi, que faz o papel de
Julie.
Depois de tiros, armadilhas,
vitórias e derrotas os heróis chegam a um baú de Yamoto, que havia fugido de
avião. E o que encontram dentro? Uma serpente de ouro maciço! No cinema de
Cambé cabiam 1.500 pessoas. Mas apenas 30 assistiram a última sessão.
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