As formigas em fila indiana são escolares indo. O percurso é
longo e há obstáculos: pedras e grama formam colinas e matagais. São dois
passos compridos até chegar ao fim do trajeto. E deste lado a visão é outra. As
formigas chegam. São soldados marchando pela floresta até o obrigo cavado na
terra.
É possível observá-las dos lados. Daqui são carregadoras de
plantas enormes a caminho de um jardim. De lá são personagens de um filme na
cena de uma retirada. Há ainda a visão de cima. Ficam as possibilidades
esgotadas para o que se vê das diagonais. As versões escasseiam na medida em
que as formigas levam, sem parar, picotes de folhas verdes para um lugar.
Onde e para que são perguntas que não se fazem. A
brincadeira é imaginar um enredo e os brinquedos são as formigas. Buscar causas
e justificativas escapa do passatempo e vira estudo. A hora é de ver que as
formigas vão ou vem, andam para a direita ou esquerda, levam pedacinhos de
folhas para lá ou para cá. E inventar que são pessoas ordeiras fazendo um caminho.
Hoje são elas, ontem foram as borboletas tão raras agora
neste canto do jardim. Outrara vinham de monte e com asas de cores variadas.
Traziam estampas que lembravam desenhos rabiscados com giz de cera numa folha
de caderno velho. Quanto menor a inspiração mais perto de uma razão o
rascunhado ficava.
Amanhã haverá outra idéia e quem sabe os passarinhos serão
aviões. As britas que cercam as plantas e formam um enfeite circular podem ser
ilhas ou tanques de peixes no centro de uma praça perto da igreja. Bancos são
improvisados com gravetos. A margarida é o girassol. E o cão que ladra distante
faz de conta que é o besouro, logo ali, andando mole por causa do sol.
Sonho que se tem lá em cima, no prédio de apartamentos
residenciais. Embaixo passa o asfalto, daqui para lá, de lá para cá. Indo e
vindo, com carros correndo sem levar folhas picotadas. Ajeitar a gravata e
acertar os punhos toma tempo. Já é tarde, hora de sair para trabalhar. A
nostalgia fica na quina do sofá, esperando outro dia de sonhos após o almoço. A
vida lá embaixo é outra. Como dói ter que acordar.
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