Paredes brancas artificialmente iluminadas trazem
lembranças nem tanto agradáveis. É um ambiente limpo se olhado com visão
cotidiana e despreocupada. Nenhum vírus ou bactéria traz ameaça de infecção.
Pelo menos não se enxerga alguma espécie escondida na parede, exceto a pequena
mariposa perturbando a lâmpada fluorescente. De onde ela teria invadido o quarto,
eis uma indagação que o próprio autor da pergunta faz pouco caso da resposta.
O olho não vê e o coração não sente. É uma verdade
relativa. No amor tantos jamais testemunharam, mas ouviram falar. E sofrem. No
quarto de paredes brancas a limpeza é tamanha que irrita. Nem um cisco no chão
de piso frio. Nem uma ruga no lençol esteticamente exposto sobre a cama. Nem
uma teia de aranha na quina do forro de gesso.
Tirando a mariposa já abestalhada de tanto se bater
na luz, existiu vida por aqui? E a cama, se levado em conta a decoração que o
pano faz sobre ela, serve para se deitar ou é apenas uma peça para enfeitar o
lugar? O que sai do tom é o sofá de três lugares. Forrado de corvim marrom
causa impacto.Torna-se, porém, acolhedor quando se percebe que ele está ali
para ser sentado.
E sem frescura. Com as pernas abertas ou cruzadas,
com as nádegas de atravessado, com os pés em cima e até de lado, quase deitando
relaxado nas três vagas que ele permite. E para que tanto espaço se a convenção
é regra? Alguém e seu acompanhante, ninguém mais.
Dois seres quietos, lado a lado, no sofá. Diante da
cama vazia. Nada fazem e nem olham. Não há um tremor de pele, uma reação dos
lábios, uma piscada. Se miram para algum canto provavelmente nada enxergam,
pois o que há na frente é o branco clareado com luz.
Se há janelas as persianas estão fechadas. Faz
barulho do outro lado, mas dentro nada se escuta porque não se quer ouvir o que
ocorre lá fora. O ar é condicionado, até nisso o ambiente é produzido para
acomodar sabe-se por quanto tempo esse alguém e seu acompanhante enquanto eles
esperam.
Horas passadas e os minutos vão girando no visor de
acrílico do relógio de parede bege claro. Será que não encontraram um branco? Ou,
provavelmente, escolheram o tom pouco escuro para avisar que o tempo se esgota.
E nem se dá conta do tique taque que as engrenagens fazem para a madrugada
virar manhã, a manhã chamar o calor vespertino e a tarde invocar a noite. É
certo: ninguém, naquela circunstância, está disposto a ouvir algo.
Só depois de muito silêncio a enfermeira traz a
cadeira de rodas. Alguém é levado para o centro cirúrgico e o acompanhante
espera no quarto de paredes brancas artificialmente iluminadas. A mariposa
sumiu, não se sabe por onde ela se foi. A cama sequer foi usada, alguém
preferiu esperar sua hora no sofá. O acompanhante, inquieto, nem sentado
consegue esperar. Hospital é assim mesmo.
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