quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Crônica - O panetone de cada um


Entre a vertigem e o êxtase Luciana prefere os pés no chão.  Escolha certa para quem vive no aperto e na correria e depende da consciência plena para dar conta dos compromissos.  Inclusive os financeiros, estes que mais incomodam e tiram o sono.

O Natal está aí, escancarado nas portas das lojas em decorações vermelhas e verdes e apelativo nos supermercados em panetones que variam de três e noventa e nove a vinte e poucos reais. De repente Luciana se toca que até o panetone faz distinção entre pobres, remediados, mais ou menos ricos, emergentes e milionários.

Pouca diferença há no sabor do mais caro em relação ao que tem preço de promoção. A marca e a embalagem é que fazem um ser possível a todos e outros serem acessíveis para menos. Panetones, aliás, são presentes de Natal que uns e outros recebem.

A prática diz a Luciana que se uma amiga der a ela um panetone junto com um cartão de boas festas, significa que a pessoa que presenteou a coloca num nível inferior de amizade. É mais ou menos amiga.
Não que a pretensão fosse de um presente caro. Uma rosa, às vezes, tem muito mais valor sentimental. E as flores roubadas de canteiros alheios, estas são muito valiosas. Exigiram, no mínimo, determinação e ousadia para serem pegas.

É daí que Luciana, há três anos, decidiu que não mais presenteia com panetones, vinhos e espumantes de quatro e noventa e nove a garrafa. Certa vez ela flagrou no banheiro da empresa uma colega se queixando de ter recebido um vinho que não servia nem para fazer sagu. Imagina se fizesse um ponche com aquilo.

Então Luciana fincou pé. Desde então deixou de presentear por presentear. Para algumas pessoas nem cartão envia, pois quem recebe sente-se na obrigação de retribuir. Ou, na definição exata, retribui por obrigação.

Luciana, agora, só presenteia quem ela acha que merece ser presenteada. Entram os dois filhos, o marido, a mãe viúva, duas das cinco irmãs, uma cunhada e três vizinhas. Ninguém mais. Ainda assim a lista é grande.
Com um holerite de um salário mínimo e meio, Luciana reserva metade do décimo-terceiro para os presentes. Ela quase entra naquela pesquisa marota da entidade que representa os comerciantes de Londrina, cuja conclusão é de que a maioria dos consumidores pretende gastar cerca de quatrocentos reais em presentes.

Quase. Falta um tantinho que Luciana não pode transferir da conta de compromissos assumidos para a conta de presentes. Desde o início de novembro ela pesquisa as opções e os gostos de cada presenteado.

Disso se tem que fora os meninos, cujas pretensões são muito acima da capacidade da mãe, as outras pessoas que receberem presentes de Luciana desembrulharão seus pacotes com muita felicidade. Mesmo que os objetos embrulhados tenham custado muito pouco, elas saberão que alguém comprou algo pensando na alegria de quem recebe. O panetone pode ser barato e tem conteúdo saboroso. Mas da forma que o comércio e as pessoas o usa, torna-se apenas uma simples lembrança para não passar em branco.

Luciana sabe bem disso. Então que cada um compre o seu próprio panetone e espumante. Ela vai presentear com o seu coração somente as pessoas que merecem ser lembradas. Aliás, presentear com panetone, vinho e espumante no Natal é o mesmo que dar um par de meias sociais ao pai no dia do aniversário dele. 





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