Moço descente este fulano. Um tanto esquemático, às
vezes segue procedimentos e rituais que chegam a irritar. Mas dá-se por vencido
ao perceber que faz parte dele, por exemplo, entrar no banheiro masculino e só
tirar água do joelho no compartimento da direita. São três urinários instalados
na parede à esquerda, com cerca de um metro de distância um do outro. Ele pode
estar se mijando, mas não usa a patente do meio e da esquerda. Pela direita o fulano entra na fila e
aguarda.
Entre teses e pouco menos, quando as defesas são
irônicas e provocativas por serem feitas para azucrinar, já disseram que é
mania, neuroso, ideologia, miopia e segurança.
O box da direita é o último da parede. O sujeito que o utiliza não corre
o risco de alguém passar por trás e dar um esbarrão daqueles de prejudicar a
pontaria e mandar água no azulejo e no piso. É coisa que vem desde a infância,
segundo dizem velhos conhecidos: fulano sempre se irritou com alguém atrás
dele. Talvez por isso ele seja sempre o último da fila.
Tentaram por umas cinquenta e sete vezes saber dele
o motivo da preferência. Ele responde secamente que ninguém nada tem a ver com
o que ele faz ou não faz. Problema dele! Só falta fulano, cujo primeiro nome de
batismo é Joaquim, acrescentar pedido áspero para que não encham o saco. Ele
não diz isso, mas a cara mostra que o recado é este.
E a fitinha vermelha amarrada na placa do sedan
quatro portas é mistério. Pelo que se sabe Joaquim é pentecostal. Por favor,
não confundam: nada a ver com pente para alisar as costas. Já fizeram
referência parecida e ele foi rude: chamou o provocador de idiota. Porque tem
isso: ser chamado de burro é uma coisa quase normal; ser taxado de idiota é o
fim.
Foram outras teses e pouco menos. Uma ala defendeu
que era para dar sorte e foi derrotada, pois imagina como o pastor e os irmãos
reagiriam diante da prática supersticiosa de um deles? Outro grupo foi para o
mais simples: a mulher de Joaquim amarrou a fitinha na placa para identificar o
sedan quando vai ao supermercado. O carro é cinza metálico, da cor que todo
mundo usa, e de modelo parecido com o de todo mundo. Então se explica.
Ficaria nisso se não aparecesse a divergência
investindo na tese de que Joaquim estaria mudando de religião. E deu certo,
pois descobriram que era uma Fita de Bonfin, o que leva a crer que a opção é o
sincretismo. Falta só saber se é para dar sorte ou faz parte do plano de trocar
o veículo. Tipo assim: quando a fitinha arrebentar Joaquim vai à concessionária
trocar o velho por um novo.
A verdade é que Joaquim está na dele. Acorda todos
os dias na mesma hora, depois do banho nunca penteia os cabelos antes de
escovar os dentes, embrulha o sabonete num pano para evitar que o produto fique
mole e no café, que sequência: primeiro uma xícara de café, depois um copo americano
de leite e para finalizar um copo maior com o pingado. A faca é deixada
milimetricamente na diagonal ao lado do pote de manteiga. O pão francês é
cortado no meio, em vertical. E se o biscoito estiver no pacote ele não come
nada, por se sentir desacatado pela esposa. O biscoito tem que ser colocado na
biscoiteira.
Na garagem do prédio o carro dele fica certinho no
meio das faixas que separam as vagas dos vizinhos. E ai do beltrano que não
fizer o mesmo. Joaquim manda queixa por escrito para o síndico. Assim ele leva
a vida. Embora excessivamente regrado é um cara que está no equilíbrio.
Chamam-no de implicante. Mas estão equivocados e injustos. Joaquim não incomoda
ninguém se ninguém o incomodar.
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