quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Crônica - Joaquim é que está certo


Moço descente este fulano. Um tanto esquemático, às vezes segue procedimentos e rituais que chegam a irritar. Mas dá-se por vencido ao perceber que faz parte dele, por exemplo, entrar no banheiro masculino e só tirar água do joelho no compartimento da direita. São três urinários instalados na parede à esquerda, com cerca de um metro de distância um do outro. Ele pode estar se mijando, mas não usa a patente do meio e da esquerda.  Pela direita o fulano entra na fila e aguarda.

Entre teses e pouco menos, quando as defesas são irônicas e provocativas por serem feitas para azucrinar, já disseram que é mania, neuroso, ideologia, miopia e segurança.  O box da direita é o último da parede. O sujeito que o utiliza não corre o risco de alguém passar por trás e dar um esbarrão daqueles de prejudicar a pontaria e mandar água no azulejo e no piso. É coisa que vem desde a infância, segundo dizem velhos conhecidos: fulano sempre se irritou com alguém atrás dele. Talvez por isso ele seja sempre o último da fila.

Tentaram por umas cinquenta e sete vezes saber dele o motivo da preferência. Ele responde secamente que ninguém nada tem a ver com o que ele faz ou não faz. Problema dele! Só falta fulano, cujo primeiro nome de batismo é Joaquim, acrescentar pedido áspero para que não encham o saco. Ele não diz isso, mas a cara mostra que o recado é este.

E a fitinha vermelha amarrada na placa do sedan quatro portas é mistério. Pelo que se sabe Joaquim é pentecostal. Por favor, não confundam: nada a ver com pente para alisar as costas. Já fizeram referência parecida e ele foi rude: chamou o provocador de idiota. Porque tem isso: ser chamado de burro é uma coisa quase normal; ser taxado de idiota é o fim.

Foram outras teses e pouco menos. Uma ala defendeu que era para dar sorte e foi derrotada, pois imagina como o pastor e os irmãos reagiriam diante da prática supersticiosa de um deles? Outro grupo foi para o mais simples: a mulher de Joaquim amarrou a fitinha na placa para identificar o sedan quando vai ao supermercado. O carro é cinza metálico, da cor que todo mundo usa, e de modelo parecido com o de todo mundo. Então se explica.

Ficaria nisso se não aparecesse a divergência investindo na tese de que Joaquim estaria mudando de religião. E deu certo, pois descobriram que era uma Fita de Bonfin, o que leva a crer que a opção é o sincretismo. Falta só saber se é para dar sorte ou faz parte do plano de trocar o veículo. Tipo assim: quando a fitinha arrebentar Joaquim vai à concessionária trocar o velho por um novo.

A verdade é que Joaquim está na dele. Acorda todos os dias na mesma hora, depois do banho nunca penteia os cabelos antes de escovar os dentes, embrulha o sabonete num pano para evitar que o produto fique mole e no café, que sequência: primeiro uma xícara de café, depois um copo americano de leite e para finalizar um copo maior com o pingado. A faca é deixada milimetricamente na diagonal ao lado do pote de manteiga. O pão francês é cortado no meio, em vertical. E se o biscoito estiver no pacote ele não come nada, por se sentir desacatado pela esposa. O biscoito tem que ser colocado na biscoiteira.

Na garagem do prédio o carro dele fica certinho no meio das faixas que separam as vagas dos vizinhos. E ai do beltrano que não fizer o mesmo. Joaquim manda queixa por escrito para o síndico. Assim ele leva a vida. Embora excessivamente regrado é um cara que está no equilíbrio. Chamam-no de implicante. Mas estão equivocados e injustos. Joaquim não incomoda ninguém se ninguém o incomodar.


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