O outro lado da compaixão é de efeito tão positivo
quanto negativo. Depende de quem a merece. Ou de quem é vítima desse sentimento.
O comportamento humano, às vezes, implora por piedade. Se tenho um problema
familiar que o meu melhor amigo não enfrenta, quando coloco-me a narrar os epsódios
relacionados ao fato peço, consciente e inconsciente, que ele sinta pena de
mim. Às vezes quero mais do que isso. Preciso que ele assuma o meu drama. Que
ele sofra tanto quanto eu. Há momentos em que exijo: doa muito, porque assim
você busca a solução que eu não me ponho encorajado a encontrar.
Compaixão é piedade. Pode também ser co-sentimento.
Quem é que nunca pensou, após vinte anos de casamento, que continua ao lado do cônjuge
por compaixão? Claro, essa de manter-se casado ou casada tem a ver com medo.
Medo de se dar mal lá fora. Medo de fazer a outra parte sofrer. Medo de uma
estranha solidão devido a ausência de alguém que foi, no mínimo, uma presença
até o momento da separação. É aqui que os conceitos formam leques. Compaixão de
quem? De mim mesmo ou da outra pessoa? Normalmente de ambos, o eu e o próximo.
Opta-se, assim, pelo conformismo. Leva-se como der e
vier sem mexer nos padrões. Tomas e Teresa, em a Insustentável Leveza do Ser,
romance escrito por Milan Kundera e lançado em 1984, são nas relações conjugais
mais ou menos isso. Há, é verdade, um forte elemento político pressionando os
amores e os desamores de ambos, a Primavera de Praga, que transforma o
apresentável médico em um limpador de janelas. Isso, porém, não quer dizer
nada. Afinal de contas, quantas janelas limpamos aqui no Brasil com ou sem
aquele epsódio político na então Tchecoslováquia?
O mais curioso há de pesquisar no Google e encontrar
que, na concepção de Kundera, compaixão tem dois significados: nos países
latinos é mais piedade; na língua germânica é co-sentimento. Isso significa que
você pode continuar casado ou casada por ter piedade da sua cônjuge ou do
seu cônjuge. Ele ou ela, que estão do outro lado, naquele exato momento em que
você pensou no sofrimento do outro ou da outra, pode ter imaginado a mesma
coisa. E isso não significa co-sentimento. É, na verdade, falta de diálogo,
pois há duas pessoas querendo a liberdade e ambas se contém por pena do outro.
Isso é, portanto, piedade. E bem sacana, por sinal.
Já o co-sentimento! Definições existem. Várias e
programáveis, de acordo com as circunstâncias que se apresentam. Mas quando é
que ela vira prática? Pode ocorrer sim no sentido fraternal. No amor da mãe
pelos filhos, quando ela se põe a pedir à divindidade que transfira a dor da
cólica que a criança sente a ela. É uma manifestação que não só reflete uma
modalidade de co-sentimento, mas acima de tudo evidencia que mesmo livre da dor
física a dor sentimental dessa mãe é muito mais intensa do que o da criança.
Jamais, porém, se aplica ao sujeito que se põe a
chorar sobre o caixão do melhor amigo, queixando-se que sofre tanto quanto os
familiares mais próximos com a perda, e de repente falseia lançando olhares
cobiçados para as curvas da viúva. Cena trágica esta do caixão. Exemplo que
quase chega ao fálico. Ainda assim válido, pois quantas compaixões são
verbalizadas antes, durante e depois da traições? Também é oportuno, pois
quantas vezes invocamos a democracia sem saber em que fera estamos votando para
nos representar em algum lugar?
Pois é. A menos de uma semana das eleições
municipais e eu escrevo sobre compaixão e piedade. Pudera. O apelo da maioria
dos candidatos a prefeito de Londrina é que os eleitores tenham compaixão. Do
tipo, me levem ao segundo turno. Em realidade nenhum dos seis postulantes
merecem ao mínimo piedade. Há de se supor que venta a palmos do chão uma
ideologia que sustenta o pensamento do continuísmo. Deve ser isso. O meu voto é verdadeiramente ideológico. Assim eu fiz uma saladão misto e puxei para as eleições de domingo, 7 de outubro. Estou limpo, mano! E cheiroso, muito!
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