Então povinho? Tudo pronto para o 7 de outubro? Aliás, é só
no período eleitoral que o povo merece conceito lastreado no direito
constitucional e ainda assim de forma parcial, muito precária. No caso do
Brasil, onde a democracia que temos é representativa, o povo elege daqui a duas
semanas os seus representantes no executivo e no legislativo municipal.
Assim sendo, poderíamos dizer que só é povo quem vota? O
resto é povinho ou pouca sombra? Temos que ser justos: a Constituição de 1988
diz que você, que com seus 12 anos acabou de ingressar no mundo dos
adolescentes, não vota, mas é povo igual o seu colega de 16 que já tem título
de eleitor. Portanto, desarme a carranca e se ajeite, você também paga impostos
a cada ato de consumo que realiza.
Ouvi outro dia o vizinho comentando na frente do bar da rua que
faz transversal: “O povo lá de casa ainda não sabe em quem votar”. Então o
interlocutor emendou, no bate pronto: “Pois é, o povo lá da minha empresa também
está em dúvida”. E veio um terceiro, que sem pedir licença entrou no meio da
conversa: “Nem me falem. O povo da minha comunidade não quer nem falar de política”.
Povo! Lá atrás na história da humanidade, gregos e romanos
consideravam povo só quem era capaz de decidir para e pelo estado, que é a
instituição que aqui chamamos de sistema. Também no antigamente a Bíblia era
seletista, pois considerava somente os judeus povo de Deus.
Tão discriminatória quanto, mas pelo menos clara e de dedo
em riste, a turma da Idade Média dava o recado sem constrangimento: o povo era
a plebe, formada por cidadãos sem direito e considerados psicologicamente
incapazes de entrar de bicão nos assuntos do sistema.
Mais recentemente veio ao Brasil um cidadão alemão chamado
Friedrich Muller, com título de jurista e filósofo. Lançou aqui o livro “Quem é
o povo”, cuja linha de pensamento é a de que a democracia só existe onde tem
povo.
Este autor fala do povo ativo. Ou seja, ele não só participa
do processo eleitoral para a escolha de seus representantes. Estes
representantes administram ou legislam, assim como executam ou fiscalizam. Isso
depende do cargo para o qual foi eleito: executivo ou legislativo. O povo
ativo, portanto, como elemento de combate do sistema existe para impedir que
legisladores e administradores passem por cima da democracia.
A teoria é pé no chão da forma como descrevemos. O tema é
muito mais complexo do que isso. Mas se não conseguirmos nos mobilizar pelo
menos com essa entrada rústica e possível, o que pediremos na seqüência? Quando
a gente não consegue exercer a democracia, devoramos a entrada e vamos direto
para a sobremesa mesmo pagando pela parte principal do prato.
Por isso tantos candidatos nos chamam de povo. Eles apostam
que somos passivos. Então depende de nós. Começando com a certeza de que o voto
é um pequeno ato de entrada da democracia. O prato principal vem depois e só
será saboroso se nós fizermos dele algo interessantemente apetitoso.
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