segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Crônica - A rebelião dos seis


- Papai, vou ser político quando crescer.

- Político? Quem colocou isso na sua cabeça? Tem é que ter uma profissão. Pode até ser advogado. Mas de preferência seja médico. Ou engenheiro. No mínimo um agrônomo, mesmo que seja para vender agrotóxico para multinacional. Dá um bom dinheiro...

Essa conversa rolou mais de três décadas atrás. O cara ainda procura o velho pai, eterno companheiro de ombros, para falar sobre o futuro:

- Pai, ainda penso ser político.

- Mas como, filho? Você já não é vereador? Que eu saiba vereador é político.

- É que eu quero ser um grande político. Quero ser amigo da Gilma. Pretendo fazer uma administração técnica e olho no olho do eleitor dizer: meta é isso, meta é aquilo. O povo precisa de definições.

- Isso é pouco, meu filho. Muito pouco. Você consegue tirar essa batata quente da boca quando estiver conversando com o eleitor?

- Pai, eu fiz curso de oratória e tenho atendimento fonoaudiológico semanalmente. Já consigo falar igual repórter da filial da Globo no Paraná. Narro uma crônica policial como se estivesse declamando uma poesia de amor.

- É pouco. Consegue colocar a alma nas palavras, filho?

- Veja o que faço. Escuta e sinta: “Eu e meu vice vamos fazer isso e aquilo”.

- Não vi alma nisso. Está molenga. Nem sendo o meu filho consigo acreditar no que você diz. E por que não você? Tem que ser o seu vice?

- É estratégia pai. Assim também como é estratégia o cabelo esquisito que usei quando falei que sou amigo da Gilma. Foi para parecer autêntico.

- E quando você entrou falando com aqueles olhos fechadinhos, de sono, preguiça e pouco caso, filho? O que aconteceu.

- Ali me assumi como sindicalista, pai. Cansado de tantas lutas.

- O que? Quando você foi sindicalista na vida? Nunca vi você com um adesivo de campanha salarial no peito? E essa história de meta é isso, meta é aquilo? Isso é muito confuso. Não precisa explicar a ninguém o que é meta. Tem é que cumprir com as metas. Concorda, filho?

- Pai, o senhor não está me entendendo. Eu disse que quero ser político. Isso exige mais do que meia dúzia de faculdades. É acerto de um lado, acerto de outro, bom dia para cá, boa tarde lá e sempre aprendendo. As coligações, por exemplo. Pai, é direita, centro, centro-direita, centro-esquerda, esquerda, em cima, abaixo, na meia altura, contra o sol, acima da chuva e assim por diante...

- É complicado, filho. O que eu posso dizer? Vamos amadurecer isso. Acho que você está muito prematuro para a política. Daqui a uns trinta anos, quem sabe?

E foram ambos assistir Pedro Bial. Depois rodaram um DVD do programa da Fátima Bernardes. Comentaram o CQC e elogiaram Ana Maria Braga. Procuraram na internet novidades sobre o programa do Ratinho e encontraram citações sobre Rafinha Bastos. Escutaram tchá tchá tchá tchum e lê re re, lê re re três vezes seguidas. Decidiram comprar um Gol porque Neymar aparece com uma versão na cor vermelha. Depois de exaustivamente aculturados - e como - deram-se ao bom senso de esquecer a política como carreira. É que, como intérpretes das seis coligações que disputam a Prefeitura de Londrina, são rebeldes dissimulados. Por que? Porque ninguém apresenta nada que os leve ao cargo. Significa que ninguém quer chegar lá e está fazendo corpo mole. Ou seriam tão burros assim?

- Mãe, por que o pai e o meu irmão estão chamando os seis de bundões?

- Não sei filha. Desconfio que andaram falando de sacanagem o dia todo...


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