quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Conto - Redemoinhos


Travesseiro de floco de espuma fez redemoinho na cabeça do menino. Cabelo grosso espetado não há água que assente. Dá ao moleque um jeito de arteiro. De aluno que vai matar aula. De dono de cão vira-lata que puxa animal pelo rabo. De empinador de pipa que arrebenta linha dos mais novos.

Redemoinhos lembram histórias medonhas. A idosa fala de outrora e lembra: redemoinho é o saci-pererê chegando para aprontar travessura. E se entrar no meio dele com uma garrafa e uma peneira vai prender o endiabado de uma perna só com gorro vermelho e cachimbo na boca. Mas há quem sugira: atira uma faca no meio do redemoinho e o saci vai embora.

Prender o travesso pouca valia tem. Melhor que ele se vá. Use a faca, arremessa de longe, nem precisa mirar. Deixa saci ir embora para ele entrar em outra história. Mal o encapetado não faz. Ele quer fazer graça para poder gargalhar das coisas engraçadas que faz.

Redemoinhos bagunçam o querer e o não querer. A filha do contador quer namorar o filho do dono da padaria. Ele só tem olhos para a filha da dona do bazar. Esta namora o filho do proprietário do açougue. E este jura amor pela namorada, mas bem que tem queda pela filha do contador.

Redemoinhos provocam sujeira. Foi assim no quintal da dona-de-casa. Ela varreu e se elogiou pela limpeza do lugar. E veio o vento em espiral trazendo folhas e papeis de bala. Deixou um chão imundo a pedir vassourada. Besteira limpar de novo, imaginou a dona-de-casa. Porque neste tempo de calor e ar parado logo vem outro torvelinho rodando, trazendo pó e mexendo na imaginação das pessoas.

Redemoinhos vão e voltam. Faz tempo não passa um nesta rua de prédios e asfalto. A zeladora da loja em frente garante que viu um nem tanto tempo. Ele veio sem força e torceu de leve as ramas da árvore da calçada. Nem folha arrancou. Só marcou presença para avisar que ainda existe e traz saci-pererê, de gorro vermelho e cachimbo na boca, para armar contra os descuidados e sair rindo.

Redemoinhos já não metem medo. Agora trazem lembranças dos descampados de antigamente a quem vive atravessando avenidas movimentadas de carros conduzidos por pessoas que trazem na cara o jeito de sacis furiosos que não gargalham. Estes de hoje em dia xingam, ofendem e são desaforados.



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