quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Conto - Produtos à mostra


Branca de Neve comprou uma loja de variedades. Decidiu virar comerciante quando se tocou ser talentosa com as vendas. Foi num breve período de voluntária na mercearia do cunhado que ela percebeu ser excelente nos negócios. Em uma semana vendeu o estoque de carvão úmido encalhado há três anos no estabelecimento sob suspeita de negar fogo.

Metida num vestido dois palmos acima dos joelhos, sem mangas e decote quase lá, Branca de Neve subia e descia a escada de alumínio para pegar lá de cima, além do carvão, caixas de detergentes, pacotes de sabão em pó, fermento, farinha de trigo, óleo de soja e outras bugigangas. Diziam dela os fregueses barbados: “Que mulher esforçada!”

E a batata, já com as raízes estourando? Branca de Neve zerou. Botou umas caixas do produto no chão e ela mesma fazia questão de selecionar para os fregueses, que faziam fila e nunca reclamaram da demora. Agachadinha, Branca de Neve mostrava-se farta de qualidades que escapavam do decote e da subida do pano acima da metade da coxa. E diziam dela os pacientes compradores de batatas: “Esta mulher entende do negócio!”

Assim foi com o queijo encapado com mofo, a mortadela esverdeada, a lingüiça rançosa pendurada no varal feito de arame enferrujado, as vassouras com cabos quebrados, as pastas de dente endurecidas pelo tempo, os sabonetes sem cheiro e a carne de sol cujo aspecto nem Totó, cão sem dono das proximidades, ousava cheirar para testar o apetite. Tudo vendido e diziam dela os compradores: “O que esta mulher mexe tem um gosto especial!”

Branca de Neve, agora no seu próprio negócio, vai vender abajur, lâmpadas, isqueiros, toalhas, panos de prato, canecas, canetas, copos, panelas e tapetes. Já tem gente, três dias antes da inauguração da loja, imaginando como ficarão expostos os produtos: três palmos acima dos joelhos, mangas cavadas e decote lá.

Fantasia e ilusão. Ninguém ainda sabe, vou adiantar: Branca de Neve convocou os sete anões para atenderem em sua loja de variedades. Ela anuncia a abertura do bazar enquanto decora o seu escritório, lá em cima, de onde poderá, por uma janela, observar o movimento lá embaixo. Espera uma fila de homens comprando toalhas, lâmpadas, panelas, panos de prato e outras bugigangas. Suas qualidades de mulher ela pretende usar só nas campanhas promocionais que serão lançadas quando o movimento cair.


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