sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Conto - Edinalva...


O que pensa Rodrigo da vida? Eu, que sou mãe e pai, custo-me a crer que haja um horizonte na direção que os olhos do menino apontam. Se há luz ou sombra não sei. Se as pessoas que passam pela frente são visíveis tenho dúvidas.

Às vezes eu penso por ele. Dou-me ao direito de escolher caminhos, ambientes, situações e clima. Vou pelo lado da rua que dá sombra para evitar o sol em seu rosto. Se chove procuro a proteção das marquises. Juro que não é por mim. É por ele.

Ontem comprei roupas. Fui clara comigo mesma que o melhor seria o jeans sob a camisa verde clara. Nem me toquei que as peças serão vestidas nele, não em mim. E se ele preferisse um conjunto de malha macia e confortável?

É que sou também irmã dele. Mãe, pai, irmã e confidente, mesmo diante do silêncio que a vida colocou entre nós. Eu falo sem saber se ele quer ouvir. Penso que minha voz o tranqüiliza, que dá a ele a certeza de que alguém o quer ouvindo palavras ditas com franqueza. Até as broncas saem carinhosas e olha que é um carinho extraído do coração. Não há maquiagem na entonação.

Imagino como seria se fossemos iguais. Quem de nós dois seria mais arteiro? Qual de nós aprontaria com o outro? Seriamos tão próximos não sendo diferentes? Tenho minhas dúvidas.

Ele, adolescente de senhas guardadas na memória para atender as namoradas, teria pouco tempo para mim. E na miséria que me seria dedicada provavelmente brigaria por seu espaço e seus direitos de homem e filho mais novo.

Reivindicaria o uso do carro da família e eu ficaria a pé. Teria o domínio do controle da tevê por assinatura. O seu espaço no sofá seria aquele de melhor ângulo para a tela de plasma de quarenta e duas polegadas. O melhor computador seria o dele. O quarto com janela para as vizinhas adolescentes seria reservado a ele.

Duvido também de mim se as circunstâncias fossem outras. Teria os meus namorados e pouco ligaria para as dominações dele. Faria de conta que ele manda. Mas com sutil estratégia conquistaria mais do que o controle da tevê, o melhor lugar do sofá, a janela mais aberta para um lugar do mundo que só interessa a mim. E faria dele o meu motorista.

Meu irmão! Penso que você se submete a mim e eu me submeto a você só por causa da vida que te trouxe assim. Verdade! A sua paralisia cerebral tira muito da minha vida. Mas me dá a oportunidade de conhecer você assim, entregue aos meus cuidados. Quieto e carente dos meus caprichos.



Nenhum comentário:

Postar um comentário

PARTICIPE: