segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Conto - A lua cheia sabe dos meus temores

Veja que é lua cheia e eu não tenho medo de lobisomens. Ela ocupa um pedacinho do céu, bem na parte ao lado da quina do prédio em frente, quase nos últimos minutos da primeira madrugada em que se pôs. Eu a vi! Gigante e soberana! E percebi que lá de longe ela me observa.

Não me senti invadido logo ao despertar, com os cabelos desarrumados, olheiras denunciadoras de um sono abalado, boca seca e cheiro de edredon pedindo lavagem. Juro! Encarei-a como um amigo íntimo. Afinal de contas, quantas vezes ela me flagrou em delito? O cigarro escondido, os passos trôpegos da bebedeira, os beijos roubados, o sexo descuidado e outros exageros. Inclusive os cachorros quentes devorados em tantas madrugadas em carrinhos de duvidável higiene após noites de embalos e folias.

É isso. Não tenho medo de lobisomens. Mas tenho receio dos meus fantasmas. Porque não os vejo, mas sei que me perseguem. São fantasmas de uma dimensão que é só minha. Estão na minha alma. São coisas que eu fiz pela metade e fechei o balanço sem um desfecho. Ou que eu não fiz. E sei fiz, desfechei errado.

Mulheres que fiz chorar, oportunidades que deixei passar, intolerâncias, incompreensões, azedumes desnecessários, são estes os meus fantasmas. Talvez mais do que isso, a memória age, às vezes, de acordo com a conveniência.

Haveria por parte da lua cheia uma cobrança dessas coisas pendentes? Confesso que já tentei me aliar a ela. Em cada ato desses que eu pus estragos por fazer sofrer a mim mesmo ou a outros sempre estive consciência que de algum lugar ela era testemunha de um erro. Mesmo na lua nova. Que fosse minguante ou crescente. Mas era ela, a lua cheia, indo ou vindo.

Ela não me impõe castigos e nem me diz que devo refazer algo que fiz errado. Não me pede para completar o que ficou pela metade. Não exige que eu faça aquilo que eu devia ter feito. E é justamente pelo silêncio que a presença dela me tortura. Eu tenho medo dos meus fantasmas.

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