quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Crônica - Variedade, fartura e conversas em dia

O lagarto recheado era uma das especialidades de dona Luiza. Ao molho, a carne ficava macia e saborosa. Cortada em fatias, pedia repetição. Mas havia opções. O frango temperado e assado em casa, no forno do velho fogão de quatro bocas, fazia a turma esquecer do peru. Crocante por fora, a carne derretia na boca. E não há exagero nessa avaliação. Um peixe assado também era tradicional. Dona Luiza se preocupava com os diferentes gostos do filho único e das três irmãs, do marido, dos genros, da nora e dos netos.

Onze netos, a maioria na fase da correria, do copo de refrigerante virado, do arroz derramado no sofá. Sim, arroz. Dona Luiza não dispensava no Natal e no Ano Novo o sushi que ela mesma temperava e enrolava. Mas fazia questão de reservar uma panelada de arroz branco com alho, óleo e sal para os parentes que não tinham os olhos puxados. Ninguém tinha do que reclamar. A salada habitual era a adaptação da maionese: batata em pedaços grandes, ovos cortados ao meio e tempero com vinagre, pimenta do reino e sal. Nada de maionese, dona Luiza dispensava o uso daquilo.

Para beber, refrigerantes e vinho de garrafão. A marca não era nobre, mas o sabor ganhava simpatizantes a cada refeição. Dona Luiza acordava mais cedo no Natal e no Ano Novo. Ela sentia-se na obrigação de preparar sozinha toda a comida. Era uma forma de reunir a família. A turma começava a chegar lá pelas dez da manhã, quando os preparativos por conta daquela mulher já estavam bem encaminhados.

No almoço a comida era devorada sob conversas, gritarias das crianças, aparelho de tevê ligado e um ambiente interessante de soltura, desinteresse e fraternidade. Aquela era a família da dona Luiza: filho, filhas, nora, genros, netos, netas e marido. Ela comia pouco. Na verdade dona Luiza alimentava-se de felicidade por estar com a família.

Havia variedade e fartura na mesa de dona Luiza. Mas o luxo era desconsiderado. Costureira, aquela mulher trabalhou pelos filhos a vida toda. Com a renda do seu trabalho ajudava nas despesas de casa e economizava para as reuniões familiares que começavam pouco antes do almoço e só terminavam à noite, quando a mesa ficava praticamente vazia.

E ela sorria um sorriso de contentamento. Eu enxergo aquela expressão de felicidade todos os dias. O meu Natal é de poucos preparativos. Na verdade, eu passo pela data como se ela fosse mais um dia de nossas vidas.

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