quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Conto - Dias de chuva e de imaginação

Descia chuva lá adiante, ele via o sinal muito além das casinhas que a visão permitia. Longe, depois do amontoado de árvores, quase onde o céu encontrava com o chão depois de fazer a meia esfera da bola que é a terra.

Se choveria perto ele não sabia. Mas se chovesse a pipa não subiria, isso era certeza. Teria que arranjar outra ocupação. E se chovesse forte a imperfeição da rua sem asfalto formaria lagos que teriam peixes imaginários, monstros aquáticos, barcos de papel e pescaria.

A chuva, então, não seria de todo mal, embora formasse barro no quintal e provocasse broncas da mãe a cada par de chinelos enlameados. Valeria a pena a repreensão materna, mesmo que o encardido da roupa demorasse dias para deixar de ser motivo de reclamação.

Depois chegariam os insertos anunciando a estiagem. Ocupariam os ares no lugar das pipas de linhas sujas enroladas em latas. E se brincaria de guerra, com aviões bombardeando vilarejos.

Viriam também as minhocas e estas seriam transformadas em enormes gibóias combatidas por valentes lutadores. Aos poucos os pássaros voltariam a cantar e as cigarras a ensurdecer.

E o sol, no seu retorno lento, levantaria fumaça ao bater na terra úmida. E ele pensaria na pólvora queimada do brincar de guerra antes, durante e depois da rápida precipitação que mexeu com a sua nostalgia. Foi questão de minutos olhando o lá fora atrás do vidro da janela de um apartamento muito distante do chão, lá embaixo, que tinha cara de ter vida.

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