sexta-feira, 21 de maio de 2010

O homem despido (Parte 2) - Para quem os jornais são produzidos



Duas mortes violentas ocorridas em Londrina nos meses de março e abril servem de parâmetro para mostrar qual deles, na ótica dos meios de comunicação de massa, é mais importante. Infelizmente.

Sim, infelizmente. Porque vejo-me obrigado a uma análise com base no sofrimento de duas famílias. Mas faço-a com a melhor das intenções, pois sou pelo debate que leve à consciência e ao acerto.

Em março, um rapaz de 18 anos de idade foi morto por bandidos na Zona Norte ao reagir a um assalto. Por volta das quatorze horas, o portal de notícias Londrix, dos jornalistas Nelson Capucho e Ruth Meira, enviava Newsletters com os acontecimentos mais recentes e incluia no repasse feito pela internet o homicídio.

Algumas emissoras de rádio também noticiaram o fato. Entre o final da tarde e o início da noite, alguns jornais de televisão deram mais tempo para a notícia. Outros se limitaram a notas.

No dia seguinte, os jornais impressos praticamente reproduziram o que as emissoras de rádio e de televisão e os portais da internet haviam divulgados com quase 20 horas de antecedência. Dias depois, o pai manifestou, por carta enviada a um jornal, a sua dor.

Em abril, um jovem de 25 anos foi morto por bandidos na saída de uma tradicional faculdade particular de Londrina (Unifil), também ao reagir a um assalto. O homicídio foi tratado pelos jornais com destaque. Autoridades foram ouvidas sobre a violência. Algumas lideranças pediram providências do Estado. O prefeito foi visitar a direção da escola. Por quase uma semana o caso mereceu pautas das redações e foi repercutido.

Em alguns casos, com escancarado sensacionalismo. Em outros, até com certa sobriedade, da maneira que um tema deve ser noticiado. Amigos do estudante morto foram entrevistados. As reportagens mostraram que o rapaz era trabalhador e estudioso.

Entre as diferenças de um e outro caso, um fato preocupante: soube-se que o jovem de 18 anos também eram estudioso, esforçado e trabalhador porque o pai teve sua carta publicada. Se não enviasse uma carta ao jornal, não saberiamos que alguém produtivo e promissor foi mais uma das vítimas da violência em Londrina.

Nos dois casos, não era a desgraça o foco de interesse da população. Mas a notícia bem feita repercutiria nas autoridades, exigindo delas ações concretas para reduzir a criminalidade.

Acontece que nem sempre os acontecimentos, bons ou ruins, bastam. Alguns veículos de comunicação planejam suas notícias de acordo com os seus interesses, inclusive econômicos.

No capítulo anterior desta série, falamos do tempo do regime militar e da censura nas redações dos jornais. Aquela censura acabou. A que predomina hoje é tão nociva quanto a outra. Cala-se quando se é conveniente. Acertos podem reduzir ou aumentar a importância de um acontecimento.

Às vezes os profissionais de comunicação ficam reféns dessa regra velada e não assumida. Há também aqueles que se entregam ao jogo, como se isso fosse normal.

A obrigatoriedade do diploma de jornalista não tem, na prática, o objetivo de encher as redações de graduados, mas de colocar no lugar certo profissionais que tenham a ética como o ar que mantém o ambiente no qual vivemos respirável.

Portanto, cá também temos homens despidos. Talvez por isso não tenha bastado noticiar que o padre foi pego cometendo um crime. Foi preciso mostrá-lo quase nu, com a imagem de uma santa ilustrando um cobertor.

AMANHÃ, AUTORIDADE OU BANDIDO?

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