sexta-feira, 3 de abril de 2009

Crônica - Onde é que eu me enquadro?

Entro nos cinquenta e três a exatamente vinte e nove dias, algumas horas, tantos minutos e consequentes segundos. Contados de agora, perto das quatorze horas do dia três de março de dois mil e nove. Há um ano eu estava longe da minha terrinha, sentado na frente de um computador numa sala refrigerada artificialmente por dois aparelhos de ar condicionado.
O palco deste cenário é a redação de um jornal, em Jaraguá do Sul, Santa Catarina. A cidade do melhor jogador de futsal do planeta é cercada por morros. O mais famoso deles é o Morro das Antenas. Nada a ver com a emissão dos sinais que permitem os aparelhos de televisão daquele lugar captarem alguma coisa. Muito menos em função das enormes torres de telefonia celular que fazem os aparelhinhos tilintarem dia e noite e em qualquer lugar, inclusive nas salas de exibições dos cinemas. A fama vem dos parapentes. Jaraguá do Sul sedia eventos internacionais de gente que se pendura naquelas asas enormes e pula lá de cima. Em dia de tempo bom, esses trecos tomam os céus da cidade. Jaraguá tem a mais conceituada fábrica de parapentes da América Latina, não por pura coincidência, mas por estratégia do empreendedor.
Daqui a um ano devo estar em algum outro lugar. Londrina, a minha terrinha, já me deu bastante e agora está impossibilitada de me oferecer algo. Bem que eu gostaria ficar por aqui. Trabalhando, é claro. Londrina não é lugar de gente parada. Só fica parado aqui que não tem emprego. Este é o meu caso. Preciso praticar jornalismo de redação. Preciso buscar informações nas ruas e voltar para o jornal com as anotações em papéis amassados e manchados de suor. Preciso pegar aqueles papéis, decifrar as anotações, e escrever. Preciso ser interativo com as pessoas que ouço para escrever as minhas matérias e preciso ter interatividade com os leitores, usando dos recursos que um jornal impresso me oferece.
Cinquenta e três anos... idade de mais para pleitear uma vaga? Tenho trinta e três anos de registro em carteira, tirando os meses que fiquei desempregado e os períodos de free lancer. Desse total, durante seis anos fui bancário. O resto foi no jornalismo, com a predominância dos impressos, depois a televisão, a assessoria de imprensa, as aulas na Universidade de Londrina e o rádio. Em um dos jornais entrei repórter e sai chefe de redação, após dezoito anos de casa e uma renúncia ao cargo. Claro, sem a possibilidade da empresa reduzir aquele baita salário que eu tinha - assumi a chefia de redação para ajudar a empresa a sair de uma crise financeira, com um salário muito inferior ao de mercado para o cargo -, a única alternativa para mim que ela tinha era a demissão.
Na epoca, eu ainda pensava que em jornalismo a experiência era uma boa referência profissional. Dei com a cara, pois as coisas mudaram. Hoje, em jornalismo impresso, existe a neurótica concorrência - assumida inclusive por alguns jornalistas - com a internet. Nessa doença, há quem diga que o impresso é atualmente apêndice da internet. Por isso os empresários diminuiram o tamanho dos textos, encheram as páginas de penduricalhos, inventaram a interatividade burra e os jornalistas assumiram.
Para fazer textinho de nota concordo que o jornalismo impresso não precisa de talentos. Contrata-se mais barato para preencher o quadro. Para retomar a força do jornalismo impresso é preciso, antes de tudo, inteligência do dono do jornal. Não é preciso dizer mais nada. Enquanto isso, os bons profissionais, na medida em que vão perdendo seus empregos, deixam a cidade ou montam um bar na esquina mais próxima do último emprego. Será que a juíza que sentenciou o fim da obrigatoriedade do diploma tinha razão?
Engraçado. Eu não encontro emprego porque sou velho. Um conhecido, recém-formado e ainda nas fraldas, queixou-se outro dia que não consegue trabalho porque é inexperiente. Outro conhecido, no meio termo da idade e da experiência profissional, disse recentemente que em Londrina só tem vaga por QI, o famoso quem indica. Algo está errado. Espero que não seja a minha análise.

2 comentários:

  1. Por estar parada desde minha formatura (há cinco anos) tenho asensação de que não consigo me enquadrar mais.
    Por acaso achei o seu texto. A nossa situação é diferente, mas fiquei curiosa quanto ao que sucedeu depois deste post. Você voltou a trabalhar em Londrina? Ou saiu de lá e está em algum jornal em outra cidade?

    Com votos de sucesso!
    Giovana
    Porto Alegre-RS

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  2. Cada pessoa tem seu lugar especial no mundo. É claro que o mundo muda constantemente, gira frenéticamente durante as suas 24 horas e numas dessas voltas um dia nos perdemos e parece que nada mais vai ser igual. Talvez estejamos apenas vendo tudo de outra ótica, de outro ponto de vista. Talvez como escritor de crônicas, histórias e romances você possa reescrever a sua história também. Não perca nunca a fé e o fio da meada que um dia a gente se encontra.

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