terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Conto - Maracujá doce - 19

As bombas das festas juninas eram avaliadas pelo preço. Quanto mais caro, mais potente e barulhento. Uma bombinha de vinte servia para levantar uma lata de extrato de tomate até a altura de um poste. Uma de trinta arrancava o fundo da lata e ia muito acima do pico do poste. Uma de cinquenta era comprada escondida dos pais. A potência e o barulho indicavam muito perigo.
A febre dos fogos de artifício começava em maio. Já nas comemorações do Dia das Mães alguns fogos estouravam na vizinhança, levantando a preocupação dos adultos. Para alguns, o receio era do perigo. Outros chegavam ao extremo e reprimiam os pequenos com um discurso pronto: estourar bombinhas era o mesmo que queimar dinheiro. Havia também as donas de casa que se incomodavam com o estouro no momento em que escutavam uma radionovela.
Os pequenos mercados de uma ou duas portas, que vendiam de inseticida a carne seca, não perdiam a oportunidade de melhorar o caixa vendendo bombinhas para fregueses de qualquer idade. Aproveitavam a inexistência de uma lei e se permitiam a comercializar sem restrições. Uma criança de quatro anos de idade, com dinheiro na mão, deixava o balcão com um pacote de soda, ou uma garrafa de pinga, ou uma maço de cigarros.
Os meninos das ruas sem asfalto da Vila Nova economizavam no cinema para comprar os fogos de junho. Na volta da escola, iam em grupos às mercearias e saiam com os bolsos recheados com os pequenos artefatos. Antes mesmo de chegar em casa, enchiam as ruas do caminho com a algazarra típica das crianças e atiravam alguns bombas acesas nos quintais dos inimigos: eram os adultos que implicavam com as suas brincadeiras ou os moradores que mantinham cães os mais visados.
Atos de irresponsabilidade confundiam-se com ousadia. Vez ou outra um menino decidia estourar uma bomba segurando a rabetinha de papel com as pontas dos dedos. Outros, com os pés descalços, sacaneavam os parceiros pisando nos fogos que estes soltavam. Apagavam o sonho do estouro do dono do artefato ou, quando calçados, permitiam que a bomba explodisse com o barulho abafado pelo pisão.
Três festas juninas eram típicas no bairro. Seu Chiquinho era o promotor da primeira delas, a de Santo Antônio, na véspera do dia 13 de junho. Uma bandeira do santo, escorada num mastro, era fincada na entrada da casa. A lenha da fogueira começava a ser empilhada logo após o almoço. Seu Chiquinho, um carroceiro, tratava de providenciar madeiras descartadas e troncos secos de árvores dias antes. Tudo era empilhado na beirada da rua, bem em frente ao seu quintal.
À noite, quentão, pipoca, batata-doce, milho cozido, paçoca, doce de leite eram distribuídos aos participantes: vizinhos, parentes e conhecidos que vinham de longe. Corria no bairro que os promotores das festas de junho pagavam algum tipo de promessa, por isso tinha que comemorar os santos de junho todos os anos.
A festa de São João acontecia na casa do próprio, seu João, morador da mesma rua de seu Chiquinho. Seu João tinha um time de meninas e belas moças em casa, todas morenas, de cabelos negros levemente ondulados. Das seis filhas, Angélica era a mais nova e a mais espevitada. Adolescente, a menina-moça chamava a atenção dos rapazes que procuravam por namoradas.
Acostumada a brincar com os meninos nos jogos de bola queimada, Angélica tornava-se uma espécie de anfitriã dos participantes da festa organizada pelo pai. As irmãs empenhavam-se desde o meio da tarde nos preparativos da batata-doce, do pinhão, do amendoim, do milho e dos bolos. A pipoca era estourada depois, na medida em que as pessoas chegavam.
Os rapazes, atiçados pela presença de mulheres bonitas, buscavam opções nada atraentes para serem percebidos. Recorriam aos bucapés, odiados pela raparigas, para assustarem as crianças e os idosos. Na maioria das vezes cortavam a vareta do buscapé, para que o fogo de artifício saísse em zigue e zague sem ganhar altura e explodisse nos pés de alguém.
A última festa, na rua de baixo, era organizada por seu Pedro, na véspera do dia 29 de junho. Fechado e de poucos amigos, seu Pedro tinha menor frequência no seu evento. Os meninos da rua de cima tinha receio de participar. Observavam de longe e saboreavam somente o cheiro das guloseimas. Riuzim, recomendado pela mãe, Margarete, ajuntava-se com a sua turma, na beirada do campo de futebol, para brincar de pega e esconde.

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