domingo, 7 de dezembro de 2008

Crônica - Só até o meio da estrada

Quantos foram os telefonemas no meio da madrugada? Atormentada pela insônia, ela ligava e pedia um ombro. Dizia ter medo de dormir e não acordar mais. Reclamava de pesadelos durante as breves adormecidas. Jurava que só ele era capaz de tranquilizá-la.
Ele ouvia. Procurava realmente acalmá-la relembrando epsódios turbulentos da vida de ambos. Dizia a ela que tudo não passava de reação. O estresse mexia com o psicológico, que por sua vez interferia no sono e resultava em pesadelos.
Longe de ser um profissional da psicologia, ele se baseava na razão para usar tais argumentos. Redemoinhos passados realmente pertubavam. Vez ou outra, seus efeitos pareciam se tornar assustadoramente presentes. Ela, constantemente, reclamava sonhar com a morte. Dizia que todas as mortes que havia lamentado nos últimos tempos haviam sidos previstos em seus pesadelos. Pedia para ele se cuidar.
Ele, então, improvisava poesias para encerrar a conversa negativa. Inspirava-se no amor entre ambos e retomava o pacto que haviam selado há anos: quaisquer que fossem os obstáculos, caminhariam por aquela estrada criada no imaginários dos românticos, de terra batida, com moitas de capim e ervas nas beiradas.
Um conduziria o outro, até chegarem ao topo, onde encontrariam aos lado de uma cabana aconchegante uma mina de água pura para matar a sede. Acomodados ali, aguardariam os dias de chuva para escrever no vidro da janela os seus nomes dentro de um coração.
Houve um tempo em que ambos subiram juntos a estrada do imaginário. Entre troca de beijos e afagos, juras de amor romperam o silêncio da mata próxima daquele sonhado lugar. Tinham a certeza de que chegariam no topo, tamanha era a vontade de beberem da água fresca e descansarem depois no canto mais acolhedor da cabana.
Não fosse o destino, conseguiriam até aguardar pelo período das chuvas. No vidro escreveriam uma história de muitos sentimentos e luta. Foi um momento desses de indecisão que cada optou por uma bifurcação da estrada. Ele, por motivos profissionais, partiu primeiro e passou a ficar cada vez mais só. Ela ficou, mas cresceu em outros interesses e esqueceu da estrada, da cabana e da água límpida da mina. Disse adeus e se foi para o outro lado, onde, provavelmente, sonhará com outras temporadas de amor.

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