quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Conto - Desiguais

Wilson, Milton e Hilson eram irmãos com um ano e pouco de diferença na idade. O mais velho era alto, magro e tinha os cabelos claros, puxando a família da mãe, formada por homens esguios. O segundo trazia o biotipo do pai, de troncos largos e estatura mediana cobertos por uma cabeleira lisa e densa de cor preta. O mais novo era a mistura das duas ramificações familiares. Alto, gordo e de cabelos castanhos claros, estalava olhos pretos abaixo das grossas linhas das sobrancelhas.
Eram também diferentes no comportamento. Wilson carregava um semblante alegre e espalhava simpatia. Conversava desinibido com qualquer pessoa e parecia dominar todos os assuntos. Era chegado a uma brincadeira nas conversas, mas tomava o cuidado de não causar constrangimento no interlocutor. Suas piadas eliminavam tocar em raça, cor, religião ou preferências.
Milton era fechado e raramente estampava um sorriso. Tendia a ser grosseiro e deselegante. Explosivo, provocava o afastamento das pessoas e nem no bar que frequentava após o expediente notava-se o fulano com algum amigo.
Hilson despontava como um grande intelectual. Nesta condição, as pessoas é que o evitavam, pois raramente o rapaz encontrava alguém disposto a uma retórica diante de tanta praticidade que a vida exigia. Analisava a política como um doutor, da mesma forma que conhecia as particularidades das artes, começando pela música e ultrapassando as grandes obras de pintores e escritores famosos.
Nas salas de aula, Hilson intimidava, sem propósito, até mesmo os professores. O perfil intelectual carimbava-o como um mala, pois não havia ninguém da idade dele disposto a trocar a mesa de um bar com assunto de mulher e futebol por um reservado da biblioteca destinado aos fóruns culturais.
As diferenças resultavam numa avaliação equivocada dos filhos por parte dos pais. Maria Joaquina tinha Wilson como o filho mais cativante. Aquele que perdia horas conversando com a mães sobre as questões corriqueiras da casa e da vizinhança. Para ela, Hilson, o mais novo, era um nariz empinado e tinha que aprender a ser gente. Milton, o do meio, "sabe-se lá por qual motivo cresceu essa figura intragável e chata", conforme repetia para as vizinhas.
Ernesto, o pai, enxergava Hilson como uma grande promessa. Acostumado com o trabalho pesado, ficava admirado com o conhecimento do filho. Milton, o do meio, era analisado com certo desdém: "É o jeitão dele, mas trabalha que nem um condenado e se ninguém encher o saco dele fica no seu canto". Wilson, o mais velho, "era um palhaço".
Anos se foram e cada um seguiu o seu rumo. Maria Joaquina virou avó de Rodrigo, filho de Milton, porque o destino afastou dela o sempre disposto Wilson, que foi servir o exército na capital e ficou por lá mesmo, onde arranjou mulher, emprego e casamento.
Ernesto, aposentado, decepcionou-se com Hilson, quando sentiu-se desprezado durante uma solenidade e imaginou que o filho tivesse vergonha dele. Sem saber como se aproximar de Milton, fechou-se na oficina improvisada no quintal e passava praticamente o dia consertando isso ou aquilo.
A vida deixava rastros enquanto o tempo seguia adiante. Que se lembre, a história começou com Maria Joaquina e Ernesto, que trouxeram Wilson, Milton e Hilson, que aumentaram a família com Rodrigo, depois Tiago, em seguida Camila e por último Adriana. Todos desiguais, se Joaquina tivesse ainda disposição para comparar os temperamentos de cada um e Ernesto coloca-se como homem de ter preferência por um ou outro filho ou neto.

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