O uniforme de trabalho carece de uns acertos.
Precisa ser para ontem, não se sabe quando é que os primeiros compromissos da
temporada serão fechados. É coisa para ser feita em casa, à noite, no sofá e em
frente à tevê durante os intervalos das novelas. Basta uma agulha e alguns
centímetros de linha. Com boa visão os pontos ficam caprichados. Um reforço de
costura aqui e um cerzido ali resolvem.
Foi um puxão de menino metido a besta que
descosturou a manga da túnica. Sorte que não rasgou. O furo na perna da calça,
bem na altura da coxa, foi descuido de um fumante. Certo, não teve má fé.
Naquele aperto baixou o braço depois da tragada e por acidente apagou a brasa
do cigarro no pano. Nem deu tempo para xingar porque ao sentir a dor do
queimado e perceber o estrago o sujeito já estava adiante, tentando dar mais um
trago no fumo torto e sem fogo.
E olha o tamanho da mancha nas costas! Só pode ser o
sorvete de casquinha que a criança entornou. Se for isso uma boa lavada devolve
a cor. Mas se foram aqueles rapazes que acertaram o tecido com tinta sabe-se lá
se sai. E nesse lugar não cabe remendo. Fosse na frente e se faria uma imitação
de bolso.Tem até pano sobrando numa das três gavetas do quarto.
Quanto ao branco que imita neve caindo na parte da
frente... talvez uns apliques de algodão e ninguém perceba as falhas. Só tem
que tomar cuidado, senão o enfeite desgruda e dá vexame. O cinturão preto e
largo usa-se o mesmo de antes. É de corvim e só pede uma boa água para ficar
novo. As botas, na falta das de couro preto, apela-se para as de borracha. Os
pés chamam pouca atenção.
O que vale é o saco de balas. Branquinho, limpo e
cheiroso. Tem que dar boa impressão. Tem pais que recusam aos filhos doces
carregados em sacos sujos. A barba está pronta. Os óculos estão com as lentes
quebradas. Usa-se apenas o aro e pronto. As risadas longas e estrondosas quem é
que não sabe imitar? Se a garganta estiver boa sobra para muitas gargalhadas.
Quanta bobagem! Sessenta e sete anos e fazendo este
papel. Vou ser de novo Papai Noel pago por uma loja de variedades. E nem me
recordo se algum dia, quando criança, recebi uma bala de algum. Nem chaminé a
casa onde eu morava tinha. Um dia mamãe comprou um jogo de luz. Foi o único que
tivemos nos nossos natais. Acendia e apagava e a gente esperava que ele viesse.
Mas quem vinha era o papai, suando após a jornada de trabalho estendida em
dezembro. Sempre sem poder trazer presentes.
Vai restar uns trocados com o dinheiro da temporada.
Ajuntando com a aposentadoria mando consertar a bicicleta. Ela precisa mais do
que graxa. Os dois pneus e mais os raios quebrados nas rodas estão garantidos.
E se der compro um selim novo. Que não venha o grupo de reis no dia seis. Pouco
tenho para retribuir a visita.
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