quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Crônica - Por um plano de governo


- Alguém tem um plano de governo para me emprestar? Qualquer um serve. É só para a campanha eleitoral.

- Tenho aqui um que copiei da internet. Completinho. Mas foi feito para uma cidade lá de cima. Nordeste ou alguma coisa.

- Mas tem jeito de plano de governo? Se tem, serve. É só para enganar o eleitorado.

- Desde que me devolva inteirinho e sem orelhas nas folhas. Gastei meio cartucho de jato de tinta para imprimir.

- Devia ter imprimido no econômico. E olha, documento em PDF! Podia ter copiado para o Word e reduzido o tamanho da fonte. Só nisso você ia economizar umas trinta páginas.

- Eu nem pensei nisso quando imprimi. Na época eu pretendia ser candidato a prefeito. Mas não é só no tamanho da fonte que o documento ia ficar menor. Olha a entrelinha! Cabe em cada uma delas pelo menos mais duas linhas de texto.

- Pois é. Isto aqui ficaria na metade. Mais fácil de carregar, menos espaço na pasta...

- Só que desde jeito é muito melhor para ler. Imagine você num debate? Pondo e tirando os óculos para ler?

- Ler? Que nada. Isto aqui é só para eu dizer que tenho um plano de governo. Claro, com esta quantidade de páginas dá volume. Se o debate for na televisão eu pego o calhamaço e mostro.

- Só não deixa alguém conferir o conteúdo. Este plano inclui um programa municipal de combate à seca.

- Sério? Mas se alguém tiver acesso e me questionar eu rebato. Digo que o meu plano é para acabar com as magrinhas. Vai ter no edital do concurso público que só trabalha na prefeitura mulher com mais de oitenta quilos.

- Se for assim você perde os votos das magrinhas. Acho que vai fazer diferença no resultado final.

- Que nada. Ontem fui ao shopping e passei pela praça de alimentação. As gordinhas eram a maioria.

- Não brinca com isso. Se alguém da oposição ouve vai fazer um estardalhaço. Este plano também fala de uma política municipal para o cacau.

- E temos cacau aqui?

- Este é que é o problema. Cacau aqui só transformado em barra de chocolate e bombom. Troca o cacau por café. Altera com a caneta mesmo.

- Mas café também tem pronto no supermercado. Em pó nas prateleiras e quentinha com as promotoras de venda. Aliás, que promotora bonita aquela do supermercado do outro lado da rua. Cabelos loiros pintados de preto! Aquilo mexe com a gente.

- Fala baixo. Para o eleitor você só tem olhos para a sua mulher. Um cara que não sai da igreja, faz compras semanais em companhia da patroa e nunca derramou água fora da bacia.

-Ah, isso realmente eu nunca fiz. Mas a promotorazinha do café é um espetáculo.

- Depois de eleito você conversa com ela. Agora você só enxerga a sua mulher. Aliás, ela está bem gordinha. Não leve a mal, mas será a primeira colocada no seu concurso público.

- Nem me fale. Já não aguento ficar em casa com ela. A campanha eleitoral pelo menos me põe na rua.

- Então. Sendo assim...

- O que mais tem nesse plano da internet?

- Muda ali na página oitenta o negócio que faz referência ao Rio Amazonas. Aqui nós só temos o Tibagi por perto.

- É, mas fala de um lago. A proposta deste plano é construir um igual ao de Brasília, com asa norte e asa sul. Será que não dá para fazer isso também no Igapó?

- Isso não dá voto. Melhor você colocar que vai construir uma fonte luminosa em cima do prédio mais  alto da cidade.

- Sem brincadeira. Estou falando sério. E esse negócio do transporte fluvial de passageiros? Parece interessante...

- Só se for lá no Quati. De nenhum lugar para outro. E não inventa muito. Quanto mais você propor mais as pessoas querem que você prometa. Fica no trivial.

- Tem razão. Vou falar o que todos os outros candidatos falam: guarda municipal, unidade de saúde sem fila, reconstrução do Ouro Verde, viadutos, tarifa de ônibus mais barato, ciclovia ali, passagem de nível aqui e assim por diante. É fácil. Dá para disputar palmo a palmo. Que moleza essa campanha...


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