quarta-feira, 14 de março de 2012

Textinhos - De coisas bobas mas essenciais

Declaração ilegível

Eu não sei escrever palavras bonitas porque minhas letras são garranchos. Bem que eu queria e faço esforço. Mas fica na frase que rascunho coisas que eu duvido que você entenda. E assim assumo que nem nas declarações de amor eu sou legível.

Hora da tortura

Fechei a torneira e eliminei o fio grosso de água batendo barulhento na pia. Restaram os pingos por culpa do desgaste da peça que faz a vedação. Eles são teimosos e pontuais. Pingam e estalam no tempo certo. Compõem de início uma música lamurienta. Depois incomodam e torturam enquanto eu, passivo, escuto e observo sem ter reação.

Medo e teimosia

Este é o seu número, ligo ou não ligo? Por que deveria ligar se já ouço o que tem a me dizer? E qual benefício eu teria ao ouvir de novo o que você sempre me diz? Ausências, acusações, culpas e defesas são assuntos que não cabem no pequeno aparelho celular que desligo para me livrar da tentação de telefonar só para você falar verdades que eu não posso assumir.

Ponta do dedo

Escreveram de manhãzinha na janela o nome de alguém. Ficou legível enquanto a umidade do orvalho persistiu. Depois, nas primeiras batidas do sol, virou borrão e se apagou deixando no vidro apenas manchas confundidas com sujeira. Melhor assim. Aliás, eu tenho dúvidas se grafei o seu nome certo.

Ninguém manda

O cão é o dono da loira ou a loira é a dona do cão. Não se sabe e nada se afirma. Ele late, ela reclama. Ela grita com ele e ele retruca com a parada no pé da árvore para marcar terreno com urina. Ela puxa ele para seguir em frente. Ele puxa ela para voltar à moita de mato do terreno baldio. E se conclui que ninguém manda em ninguém. Eles se entendem apesar das freqüentes contrariedades durante o passeio de fim de tarde. 

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