sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Crônica - A janela cai e eu ainda sonho com ela

Retorno mais uma vez à Vila Nova, o bairro onde cresci em Londrina. Cheguei agora à Rua Juruá. Minha casa é de madeira e nunca recebeu uma pintura. Manchadas pelas chuvas as tábuas são escuras, com tonalidades diferentes entre uma e outra mata junta.

Minha casa não tem varanda e eu tenho inveja dos vizinhos que têm varandas na frente e atrás. As janelas da minha casa são de tábuas e eu fico imaginando como seria bom olhar de dentro para fora pelas vidraças das casas que cercam àquela onde eu moro. São janelas sem trincos. As de casa são mantidas fechadas com taramelas de madeira.

Minha casa não tem forro e eu enxergo os telhados quando deito, à noite. Em madrugadas claras, quando as luzes são apagadas, eu conto os pontos onde a luminosidade invade minha casa através de furos e quebrados das telhas.

Chega-se à porta da sala da minha casa subindo uma escada de cinco degraus. Antes era de madeira, mas o tempo fez os pregos enferrujarem e um dia, por insistência de mamãe, o dono do imóvel mandou construir uma de cimento.

O piso da minha casa não é encerado. Tábuas iguais as das paredes forram o chão. Há frestas em vários pontos e eu me preocupo: e se um ladrão entra embaixo da minha casa e me espia pelas frestas?

A porta da cozinha dá para um quintal enorme. Ela só é fechada por dentro por uma taramela no meio e um trinco comum em cima. Uma tábua foi corroída pelo tempo e eu tenho muito medo: um rato pode entrar à noite.

Minha casa está levantada do chão por tocos de árvores. São toras antigas que apodrecem em contato com a terra. Uma delas, de tão velha, precisou de um reforço: meu pai encheu um latão com cimento e colocou ao lado para evitar que a casa cedesse. Foi nesse latão que um dia, na correria, escorei a coxa e me feri. Mamãe me levou nos braços até o Sandu, abaixo da linha férrea, onde deram oito pontos no machucado.

A janela da cozinha da minha casa estava com pregos soltos porque a madeira já não suportava qualquer remendo. Ela despencava e um empurrão por fora poderia derrubá-la. Eu ficava com medo de alguém invadir a minha casa à noite para roubar o que? Nada havia de valor.

Esta é a parte que mais me afeta. Quarenta anos depois, morando hoje em um apartamento de uma região nobre de Londrina, ainda sonho com a janela caindo. E nem a casa velha da Rua Juruá não encontro agora. Ela foi demolida.

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