segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Crônica - Botando pra quebrar



Arlindo era um menino de calção largo e botões da camisa presos em casas erradas quando via seu pai, lá naqueles 15 de novembro de antigamente, botar a calça preta de tergal para ir votar. O garoto perdia preciosos minutos de brincadeiras no quintal para refletir:

- Botar... como é isso? Igual galinha bota ovo? Será que dói muito?

Ele se fazia perguntas. Muitas perguntas para si mesmo, pois naquele antigamente o filho não ousava fazer qualquer pergunta ao pai por medo de levar um corretivo.

- Se for que nem galinha, todo mundo fica olhando?

O pai, um balconista de loja de ferragens, trabalhava de segunda a sábado metido num macacão de brim azul escuro. Uma vestimenta suada, empoeirada e manchada de graxa por culpa do peso do ofício. Não tirava da cabeça um velho boné desbotado com a marca de um fabricante de peças estampado acima da aba. No rosto, a barba por fazer era uma marca que só desaparecia nos finais das tardes dos sábados e deixava a cara lisa também nos domingos, quando a família assistia a missa matinal.

A calça de tergal era de uso domingueiro, assim como a camisa branca, de colarinho duro e mangas longas. Havia um ritual nos cerca de 20 minutos que o pai gastava todos os domingos para se aprontar.

Depois do café com pão caseiro feito na véspera, ele ia ao banheiro e de lá saia com os cabelos penteados para trás e ajeitados com muita brilhantina. Primeiro vestia as calças, após jogar ao lado da cama o pijama. Depois procurava um par de meias, de cor escura, e sentado na beira da cama tratava de ajeitar cuidadosamente os canos das ditas sobre as canelas, de forma a não amarrotar as pernas das calças. Em seguida os sapatos.

Parecia um sacrifício ver aquele homem encaixando os calçados nos pés. Brilhantes de tanto nugget e lustro, aquilo engolia devagar o calcanhar até toda a sola do pé se acomodar. As amarras eram com os laços planejados milimetricamente, para que ficassem do mesmo tamanho.

Só então chegava a vez da camisa branca e engomada. Com os botões fechados, a barra e todo o resto que sobrava até a altura da cintura eram colocados para dentro das calças. O cinto de couro era afivelado e então o homem dava duas dobras em cada manga, com um cuidado extremo para que não sobrassem pregas mal feitas.

Antes de sair para a igreja, ele conferia os cabelos diante do espelho pendurado com um barbante ao lado da porta do banheiro e aproveitava para alisar mais uma vez os cabelos, de frente para trás, com o uso do inseparável pente flamengo.

Mas o 15 de novembro, pelo menos naqueles anos, nada tinha a ver com um domingo. Então por que o pai usava roupas e costumes domingueiros para ir botar? Um dia ousou fazer essa pergunta à irmã e só obteve de resposta que era por ser feriado e o pai ia fazer uma coisa importante que nem todo dia 15 de novembro ele podia fazer. E o menino se torturava, imaginando o pai diante de outras pessoas colocando um ovo.
- Por que será que homem tem que botar? O que fazem com os ovos botados pelos homens?

E se torturava cada vez mais, a ponto de concluir que quando chegasse a sua vez se negaria. Muito depois, quando já estava no ginásio, soube numa aula que uma coisa não tinha nada a ver com outra. Seu pai ia votar, e não botar. Também pudera, naqueles antigamentes os pais eram rigorosos e os filhos tinham medo de fazer certas perguntas. E os pais, o menino soube depois, naqueles tempos tinham muito receio de falar de política.

A moral da história: neste segundo turno das eleições majoritárias de 2010, quando será escolhido o futuro presidente do Brasil, a campanha eleitoral tendo dois candidatos como personagens de um filme de briguinhas sem graça é de tão baixa qualidade que votar, realmente, é um ato tão doloroso quanto ver uma galinha botar.

E isso não tem graça não. Dói de sair lágrimas e chorar muito mesmo. E o menino, se ainda vivesse na inocência, perguntaria:

- O que a senhora e o senhor candidatos estão fazendo com os nossos pais?

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Crônica - Já escolheu o seu tiririca?



Havia inocência nas brigas de turmas das salas de aula. As meninas disputavam a preferência das professoras e as batalhas eram com presentes. Levavam às mestras flores e frutas que ficavam nas mesas, bonitas e apetitosas. Os meninos ensaiavam uma espécie de poder nas formações que chamavam de trincas. Fulano pertencia à trinca de sicrano. Beltrano era da trinca adversária. Neste caso, uma briga de rua, na saída da escola, era a melhor manifestação de supremacia para os vencedores.

Às vezes a verborragia era a arma mais poderosa. A fulana que falou mal de sicrana para beltrana rendia rompimentos de grave efeito. Então sicrana virava a cara com fulana e beltrana, após o necessário aviso: “Estou de mal de vocês duas”.

Os meninos evitavam as professoras e no ambiente escolar as provocações eram veladas. Empurrões desaforados, mas com disfarces de incidentes, desmanchavam as filas formadas nos pátios dos estabelecimentos de ensino antes da entrada nas salas de aula.

Era assim naquele tempo. Ninguém entrava antes numa sala. Havia sempre uma fila, puxada pela professora. E ela só puxava a fila depois que todos cantassem o Hino Nacional e a diretora transmitisse os recados diários. Então o sinal batia forte, feito sirene de fábrica, e os alunos seguiam para as suas salas.

Aquilo era disciplina. E olha de quem infringisse a ordem. A punição era certa e de acordo com a gravidade da infração podia se limitar a uma permanência de pé, ao lado da lousa e perto do armário onde os livros eram guardados, enquanto os colegas aprendiam as lições do dia.

Mas em casos mais extremos a diretora era chamada. O infrator, além de um severo sermão, era punido com puxões de orelhas. Além dessas ações de advertência, às vezes o aluno era suspenso. E o comunicado sobre a suspensão tinha que ser assinado pelos pais. Imagina o drama.

Ainda assim ocorriam brigas e puxações de tapetes. Mas num tamanho de maldade que era quase inocente. Falar mal de alguém, sujar a camisa do outro, derrubar a bolsa de fulano, rasgar o guarda-pó branco que fazia parte do uniforme escolar, riscar o caderno do adversário, jogar água nas pessoas que eram do contra.

Coisas primárias, não acham? Sim, primárias demais diante do que se observa no panorama político deste Brasil. Os dois adversários conseguiram transformar este país numa república de cotistas e de minorias. Se você é beneficiário de uma bolsa assistencial, você está incluído nos debates. Se você aprova ou desaprova o casamento entre pessoas do mesmo sexo, você está inserido. E assim por diante.

Agora, caso você seja um trabalhador, que precisa de um bom programa habitacional, uma relação de trabalho justa, uma economia estável, uma saúde pública de qualidade, uma segurança sem sombra de dúvidas e uma sociedade que oportunize uma vida sem tantos apertos, caia fora. Você está excluído.

Temos dois candidatos a presidente. Os dois discursam para uma pequena parcela dos brasileiros. Ou reagimos a isso ou compramos uma cabine dupla com som estourado e botamos nele toda a coleção nacional de sertanejo universitário.

O resto é fácil imaginar. Entra as opções, que tal aproveitar a formatura e estourar rojões dentro de um hospital universitário? Para os mais acomodados, está pintando uma nova edição do BBB, o de número 11. E ficamos com medo de alguém dizer que a culpa é da maioria, usando do seguinte argumento: quem sustenta o BBB até a 11ª edição e vota nos tiriricas tem que pagar pelas conseqüências.

Agora, fala aqui baixinho, no ouvido: em qual dos tiriricas você vai votar para presidente?

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Crônica - Alicerces



Uma simples homenagem aos professores

Guardou numa pequena caixa de madeira um pedaço de giz de cada professora que fez parte de sua infância e parte da adolescência. Desenhou com uma agulha de costura o nome delas, de forma que cada pedaço tivesse a sua própria identidade: Marilza, Ana, Nilza, Matilde, Helena e tantas Marias.

Transformou tudo aquilo em relíquias. O giz da professora Marilza foi embrulhado com papel celofane verde. Deu a si mesmo a explicação para o uso daquela cor: esperança. Sim, porque foi com aquela professora que tudo começou.

Aprendeu nas aulas dela a escrever e a ler o a, depois o e, quando veio o i, o o e o u. Depois conheceu o b, o c, o d e todo o abecedário, que parecia um mistério quando a ponta do lápis quebrava na terceira linha e em pouco tempo se transformou em algo tão corriqueiro a ponto da caneta deslizar com leveza por uma folha inteira.

O giz da professora Ana foi embrulhado de azul. Porque era a sua cor predileta e naquele tempo menino evitava o avermelhado para não ter que dar explicação aos colegas sobre a escolha de uma tonalidade tão feminina. Foi com o giz da professora Ana que ele aprendeu a ler e a interpretar os primeiros textos.

O giz da professora Matilde recebeu uma capa amarela. Para essa cor nem ele teve uma justificativa sólida. Conformou-se em admitir que havia aproveitado uma sobra da capa que a irmã, já no quarto ano, havia comprado para um livro. E o giz da professora Matilde havia tido papel importante, quando riscou na lousa as operações matemáticas mais complicadas.

O giz da professora Nilza recebeu um capa de plástico transparente. E para ter consigo mesmo que não havia acontecido um desprezo na ausência de cor, alivia-se pensando que o material usado como capa era de melhor qualidade. Com o giz da professora Nilza conferiu os resultados de muitos problemas, navegou por mares distantes no atlas da geografia e conheceu alguns fatos do descobrimento do Brasil.

Até que chegou o tempo em que os tocos de giz deixaram de ter importância. Quando muito eles eram usados nas batalhas travadas pelos meninos a cada intervalo entre as aulas do colégio. Não fosse o zelo da mãe, nem a caixa de madeira com os embrulhos verde, azul, amarelo e transparente teriam resistido.

Pois foi justamente após uma aula na pós-graduação, sem giz e nem lousa, com computador e um sofisticado projetor de imagem, que ele, na volta para casa, comparou o ontem com o hoje para sondar sobre o amanhã.

Afoito, tirou a mãe já idosa do sofá para saber onde ela havia guardado a caixa de madeira: "Na última gaveta do seu armário, meu filho. Aquela onde você costuma guardar tudo aquilo que considera imprestável, mas nunca ousa se desfazer".

E ele tocou em cada toco de giz, como se apertasse o coração a cada toque, justo no momento em que terminava o 15 de outubro, Dia do Professor.

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Homenagem - Criança e Senhora Aparecida



O 12 de outubro é especial. Porque é das Crianças. Porque é de Nossa Senhora Aparecida. Porque é do Brasil e dos brasileiros.

Em Londrina, as comemorações foram concentradas na Vila Nova, onde o Santuário de Aparecida acolheu romeiros de toda a região durante o dia todo. As missas foram celebradas a partir da 6h15, prosseguindo até o final da tarde, com uma celebração na praça em frente à Paróquia.



Nas homílias, o que mais se ouviu foi um apelo para a consciência nacional. Sem forçar a barra, os celebrantes pediram à benção de Nossa Senhora Aparecida para que saibamos, inclusive, como eleitores saber escolher candidatos que sejam dignos e éticos e que atuem em defesa dos brasileiros, e não de seus interesses pessoais.

É este o Brasil que queremos para as nossas crianças. Mas para todas as crianças brasileiras, e não somente àquelas que são vítimas de homens que se rendem à corrupção, ao jeitinho, aos favores e influências por interesses próprios e de apadrinhados.

As crianças precisam de homens que possam mirar, sem constrangimento, a imagem de Nossa Senhora da Conceição Aparecida, da mesma forma que conseguem se mirar com arrogância nos espelhos e nos brilhos das vitrinas.



O vídeo postado abaixo foi propositalmente produzido sem áudio:



CONSAGRAÇÃO A NOSSA SENHORA APARECIDA

Ó Maria Santíssima, que em vossa querida Imagem de Aparecida espalhais inúmeros benefícios sobre todo o Brasil, eu, embora indigno de pertencer ao número dos vossos filhos e filhas, mas cheio do desejo de participar dos benefícios de vossa misericórdia, prostrado a vossos pés, consagro-vos o meu entendimento, para que sempre pense no amor que mereceis. Consagro-vos minha língua, para que sempre vos louve e propague a vossa devoção. Consagro-vos o meu coração, para que, depois de Deus, vos ame sobre todas as coisas.

Recebei-me, ó Rainha incomparável, no ditoso número de vossos filhos e filhas. Acolhei-me debaixo de vossa proteção. Socorrei-me em todas as minhas necessidades espirituais e temporais e, sobretudo, na hora de minha morte.

Abençoai-me, ó Mãe Celestial, e com vossa poderosa intercessão fortalecei-me em minha fraqueza, a fim de que, servindo-vos fielmente nesta vida, possa louvar-vos, amar-vos e dar-vos graças no céu, por toda a eternidade.

Assim Seja.

Este pequeno texto e as imagens são publicadas simultaneamente neste blog e em dois outros com os seguintes endereços:

http://maesanta.blogspot.com

http://foradomercado.blogspot.com