terça-feira, 25 de maio de 2010

O homem despido (Parte 5) - No embalo de uma democracia frágil e temporária


É como um bom perfume. Tem frasco personalizado e aroma contagiante. Chega um vento e leva o cheiro. O frasco fica. Vedado, ele impede que a fragrância ocupe o ambiente.

O jeito simplista de falar da fragilidade é aplicada, infelizmente, à forma como a democracia é usada. Começa nos discursos, nem sempre proferidos por democratas. Ganha solidez nos períodos eleitorais, quando os candidatos lembram que a democracia, em definição de dicionário, é o regime de governo no qual o cidadão tem participação direta ou indireta. Sobe ao pódio no dia da eleição, quando o povo coloca o seu voto na urna. Depois do resultado oficial divulgado, perde a força, quebra-se ao menor sopro, é página virada de mais um processo eleitoral.

A cada dois anos a população brasileira experimenta esta precária receita de democracia. Agora, em 2010, serão escolhidos o presidente, os governadores, os senadores, os deputados federais e os deputados estaduais. Em 2012 escolheremos prefeitos e vereadores.

Há pouco menos de quatro anos, os londrinenses ajudaram a eleger os senadores paranaenses que detém atualmente mandatos no Congresso Nacional. Também participaram da escolha de deputados federais do Paraná, com votos predominantes naqueles com base eleitoral na cidade. Desses, um virou prefeito. Da mesma forma, o londrinense contribuiu positivamente na eleição dos deputados estaduais, também principalmente os que tem base eleitoral na cidade. Assim também com o governador. Dois anos depois, a prática foi repetida na escolha de um prefeito e vereadores.

A democracia foi pelo voto, depositado nas urnas depois dos discursos e das promessas de mais democracia. Porém, o frasco rachou. A fragrância que se fez forte em certo momento se foi com o tempo. O bom cheiro virou cheiro ruim.

Às vésperas de mais uma eleição, Londrina mergulha no caos. A saúde pública deixa desamparada boa parte da população que não tem como recorrer ao atendimento particular ou de convênios. Na Câmara de Vereadores, denúncias estouram as páginas dos jornais diariamente e as pautas da Casa transformaram as sessões em ocasiões para lavar a roupa suja.

A segurança pública, debilitada, faz vítimas diárias. No trânsito, um sistema viário confusamente desenhado, sobre ruas com asfalto esburacado, torna qualquer percurso perigoso. Entidades e instituições são alvos de investigação. Trabalhadores nem conseguem atendimento respeitoso numa Agência do Trabalhador.

Nas ruas comerciais, aumenta a cada dia o número de portas fechadas. O desemprego afeta diferentes categorias de trabalhadores, embora os números oficiais, repercutidos com euforia por alguns veículos de comunicação, tentem convencer que é o contrário. O movimento de consumidores na região central de Londrina, antes intenso nos sábados, agora é de conta-gotas. Os grandes shoppings ficam vazios durante a semana.

Nem todos os problemas poderiam ser evitados pelo poder público municipal, pois acertos e soluções seriam de competência do Estado ou da União. Mas alguns estão vinculados ao desempenho e à capacidade administrativa de quem manda politicamente na cidade. O caos na saúde pública, por exemplo.

Ainda assim, devia ser considerado que a democracia é um processo participativo. Não se limita ao voto. O problema é que cidadãos comuns, como somos, raramente merecemos convocação para uma audiência pública sobre um tema importante. Muitas vezes, quando convocados, deixamos de comparecer porque estamos desacostumados disso e desconfiamos.

E os políticos que não são o prefeito e os vereadores? Para onde vão estes senhores quando pessoas esperam mais de sete horas pelo atendimento numa unidade de saúde? Que música ouvem quando o disparo de uma arma de fogo tomba mais um corpo? Em que palanque discursam enquanto trabalhadores desempregados procuram a Agência do Trabalhador em busca de uma vaga ou de entrada no Seguro Desemprego e esperam horas?

Londrina tem, além de senadores, deputados federais e deputados estaduais eleitos com votos dos londrinenses, dois ministros da República e um assessor direto da Presidência da República. "Ah, sou parlamentar e este problema não é meu." "Sou ministro e quem tem que resolver isso é o prefeito."

Nada disso. Senão como parlamentar, mas principalmente como cidadão que tem o privilégio de ser representante do povo, é dever destes deputados e destes ministros erguer a voz e com o dedo em riste cobrar soluções para os problemas londrinenses a quem quer que seja.

Todos os deputados federais e estaduais que ocupam cargos em Brasília e em Curitiba foram candidatos a prefeito desta cidade em 2008, num processo eleitoral que se esticou até 2009. Um deles venceu. Todos foram adversários na disputa. Agora, se o que venceu se mostra fraco e debilitado, cabe aos demais a tarefa de levar adiante a democracia, defendendo os seus eleitores e a sua cidade. A democracia, em sua base teórica, apregoa que se escolha um entre tantos e, a partir desse pleito, todos participem - ganhador e perdedor - de um conjuntos de ações que traga o bem para todos.

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