quinta-feira, 13 de maio de 2010

Crônica - Lição de vida

Conheci na tarde desta quinta-feira, 13 de maio, um cara desses que a gente simpatiza e planeja manter na agenda como um eterno conhecido. Alguns o chamam de Zé. Zé do que? Zé, apenas Zé. E precisa de mais? No caso dele, é o suficiente. Outros colocam um interessante complemento: Zé da Gaita. É uma referência, um carimbo ou chancela para identificá-lo como músico.

Zé está com 55 anos. Tem formação na área técnica, mas está desempregado há um ano e meio. Ganha a vida vendendo CDs e DVDs como autônomo. Zé sai de manhã para a labuta, volta para casa preparar o almoço, espera a esposa voltar do trabalho no final da tarde, e retorna para a região central de Londrina, onde tenta negociar mais filmes, músicas, shows, jogos e eteceteras.

Às vezes, quando as vendas vão mal, o Zé improvisa um jeito de cativar os consumidores. Ele carrega na sua pasta a gaita brilhante e prateada e toca algumas músicas. Com isso chama a atenção das pessoas e, do grupo que o rodeia durante as apresentações espontâneas, há sempre um ou outro que desembolsa alguma coisa para adquirir um CD ou um DVD.

O Zé mora em uma casa de fundos. Ele mesmo aproveita os horários de folga para ampliar a moradia, que ainda depende de muitos acertos para ficar no capricho. A geladeira duplex ainda tem algumas prestações para só depois de quitada ser dele, da mulher e do filho. O sofá precisa de um conserto.

Religioso, Zé recebe o complemento de "da Gaita" porque por um bom tempo fez parte do grupo de músicos da igreja católica. Ele é crítico, até com alguns aspectos da sua religião. É um cara que não deixa a batata assar.

Em alguns momentos, demonstra certa revolta com a sua condição de desempregado e lembra que a mulher, com um salário de cerca de R$ 600 por mês, é a grande batalhadora da casa.

Ele, que também trabalha, mas fora de sua área, assume a condição de desempregado e, principalmente, a realidade dos fatos: infelizmente, nesta terrinha chamada Brasil, o governo aumenta a expectativa de vida do cidadão para atrasar a aposentadoria, enquanto a iniciativa privada, municiada por gestão de recursos humanos importados de países desenvolvidos, considera um cara de 55 anos um inútil para o trabalho.

E o Zé, assim, é uma lição de vida. Ele batalha como autônomo, prepara o almoço, ajuda a lavar e a passar roupas, conserta a casa, se preocupa com o bem-estar do filho e engasga a voz quando se refere à esposa, que tanto luta por um salário tão pouco. Enquanto faz tudo isso, o Zé mantém a esperança de um emprego.

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