sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Crônica - Sem vírgulas

Procurei o último halo de luz na última rua do último bairro antes do córrego que separa a minha cidade que é a primeira para mim entre todas as outras que são as primeiras para outras pessoas. Foi para iluminar o teu rosto na foto preto e branco emoldurada pelo negro do borrão da máquina copiadora que reproduziu a sua cédula de identidade num papel branco tanto quanto o alvo da luz neon pendurada num poste cinza de um lugar escurecido pelas sombras das árvores.
Andei quilômetros para testar a resistência da minha alma no sobe e desce da rua inclinada à esquerda na curva onde pensei encontrar respostas para perguntas que me fiz e nunca pensei responder. Foi para teimar comigo mesmo que o cansaço físico é o único remédio para curar o aperto que se dá no coração quando ataca uma solidão estranha de querer ficar mais solitário no meio de tanta gente indo e vindo e sabe-se lá quantas andando para aliviar o peso que dá estar sozinho entre os que chegam e os que vão.
Tentei apagar o sol com a ponta do dedo indicador da mão direita pressionada contra a superficie brilhante do vidro por onde ele mandou um raio para esquentar a face suada do meu rosto encostado na janela da parede de um apartamento quente. Foi para sentir a impotência de não poder controlar o calor do meu corpo aquecido pelo sol apesar da frieza dos meus sentimentos congelados pelo ceticismo e pela descrença às vezes em mim mesmo e outras vezes nos outros.
Revi na contraluz a sua foto preto e branco para matar a saudade e lembrar dos seus olhos olhando para a câmera fotográfica que registrou um lance do seu jeito de encarar a sua identidade em um documento guardado no compartimento apertado da sua carteira de couro conservada na bolsa de sintético que te acompanha aonde você vai a qualquer hora do dia e da noite.
Refiz o trajeto de quilômetros para calcular em quanto tempo eu crio coragem para andar no teu caminho qualquer que seja o momento e descubro em qual lugar você busca a felicidade que vejo em seu rosto e não encontro no percurso que vou e volto sem parar e sem me desvencilhar da solidão que que persegue.
Toquei de novo o vidro da janela para acender o sol que se põe lá do outro lado do prédio e me visita com a sua quentura no meio da tarde batendo no meu rosto com um raio que queima a minha pele e esfria os meus sentimentos de crença sobre quando e onde eu devo me responder as perguntas que faço a mim mesmo há tempos e me recuso a atender.
Quem sou eu e quem é você? Para onde vamos afinal? E para que?

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